ERA UMA VEZ

ERA UMA VEZ

... um gato xadrez. Pelo que eu conheça dessa quadriculada cor, não existe gato, no mundo, macho ou fêmea, com essa pelagem. Na dúvida, vamos contar a história do gato siamês e da gatinha angorá.

Certo gato siamês foi famoso, nos seus anos de glória, entre as gatas da vizinhança que procuravam um marido de ocasião, mas já passado da idade das travessuras e engodos. Com toda essa experiência de vida era difícil ser engambelado por seus donos ou por alguma gatinha manhosa. Como todo o ser solitário, naquela noite, ele sentiu o peso da solidão.

– Hoje necessito de uma boa companhia – monologou ele.

Ainda não decidira se ia ao teatro ou a algum cinema. Saiu de casa sem destino. Ao dobrar a esquina viu, do outro lado da rua, sentada nos degraus da escada de uma casa, uma gatinha angorá ainda menina. Poderia até ser uma bela gata. Tamanho já tinha, mas por seus modos e trejeitos via-se que era ainda criança. Surpreendeu-se quando, ao passar por ela, cumprimentou-o com um

– Oi! – ronronado.

– Boa noite, linda gata! Está com frio?

– Eu, com frio? Não. Gosto de vestir-me à moda da minha raça, só isso.

– Pensei que estava com frio por causa do casaco de peles que está usando, brincou ele.

(... não se pode exibir um pouco de luxo que os machos já pensam que a gente está doente!) – pensou ela. Mas refez-se logo da indignação.

– Está sozinho? Vamos brincar um pouco? ...de papai e mamãe, por exemplo.

O gato de tantas aventuras gloriosas entendeu logo, mas, a vontade era de responder com grosseria e, para isso, nem esforço seria necessário. Era só fazer uso do seu machismo nato. Porém, com sua experiência, resolveu entrar no jogo dela para ver até que ponto ia a petulância da “mocinha”.

– E, em que consiste essa brincadeira? – perguntou, fazendo-se de ingênuo e inocente.

– Ora, é só fazer de conta que eu sou a mamãe e você é o papai. As mais velhas dizem que é gostoso!!!

– Eu nem sei como se brinca esse “papai e mamãe” – mentiu ele. Ensina-me como é que se faz, por favor...

– É simples. Tem por aí uns cantinhos escuros que a gente finge ser o quarto e...

O gato, que não era bobo nem nada, fingiu ter entendido, finalmente.

– Aaaah, fez ele e monologou com seus botões – a gatinha queria mesmo era uma noitada de aventura e romance. A pequena é moderninha, mas ainda tem cheiro de código penal! – pensou, e disse sabiamente:

– Não estou com tempo, agora. Mas me sentirei honrado da sua escolha para brincar comigo esse brinquedo. Será muito divertido. Mas me chama quando você estiver pronta, crescida e adulta o suficiente para ser “mamãe”. É muito menina ainda para essa brincadeira real. Nada tenho contra isso que você quer, mas... na época certa, quando o organismo está maduro.

Dizendo isso, sumiu no escuro da noite, à procura de algo que o divertisse, porém mais seguro e menos perigoso.

Afonso Martini
Enviado por Afonso Martini em 20/09/2009
Reeditado em 20/09/2009
Código do texto: T1820570
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