A Lenda do Tucano. - Lia Lúcia de Sá Leitão - 27/08/009

Quando falamos nas aves brasileiras o tucano por exemplo, logo imaginamos o índio Tamaquaré do lado puxando-lhe o bico até ficar curvo e o pobre pássaro ser fadado a só comer frutinhas macias e cantar desafinado.

O tucano é uma das aves mais belas da nossa fauna, mas o bichinho que hoje pouco voa nas árvores, no chão só saltita, parece que não sabe caminhar em linha reta, é mais desengonçado que um papagaio verde caminhando de um lado ao outro.

Há muito era amigo de um índio chamado Tamaquaré, o Pajé de uma tribo nômade das terras do Paranã, isso faz muitos séculos, nem os portugueses andavam em terras brasileiras.

A ave era garbosa, canora, voava de tal forma galante que fazia inveja a outras aves, tinha o bico pequeno que não pesava pra frente do corpo, mas, foi vítima de um comportamento muito feio do amigo índio, uma raiva incontrolável que resultou em alguns comprometimentos de saúde e de mutação de corpo como um bico grande que dificultava o canto, na verdade a maldade foi tamanha que hoje o bico do tucano só serve para triturar as frutinhas macias que pode comer, e de tão curvo e grande a ave até resvala e cai das próprias pernas por causa do peso da cabeça.

Tamanquaré inventou a rede por causa do medo que tinha de morrer vitimado por veneno de animais peçonhentos ou feras carnívoras que atacavam aqueles que dormiam ao relento, no chão gelado das terras vermelhas do Paraná. Apesar de Pajé, o índio não tinha em mente divulgar sua criação com os outros índios, ele se salvando nas alturas, pendurado na sua confortável rede era o que bastava. O tucano vendo que os outros membros da tribo corriam riscos de vida todas as noites , resolveu contar o segredo de Tamanquaré, medo terrível de morrer na terra fez ele inventar de tecer com cipós a rede, e deu certo, era esse o motivo dele viver bonachão nas alturas.

Hum! Pense na revolta dos mais velhos da tribo, tantos já tinham partido para outra vida e o sem vergonha egoísta nem se compadecia. Fizeram um conselho e o destituíram da Pajelança, entenda pajelança como o rito obrigatório do cargo de chefe.

Tamanquaré ficou com ódio quando descobriu que foi o tucano quem revelou o seu segredo de medo da morte. Como ele era o índio mais esperto de toda a região, não perdeu tempo, correu para a mata fez rede pra todo mundo e presenteou cada membro da tribo, os índios gratos com aquela generosidade aparente, devolveu o cargo de Pajé e fizeram festas várias noites e dias.

O tucano procurou o amigo Pajé e disse-lhe, Tamanquaré fiz o certo, o seu povo estava sempre ameaçado, você me perdoe, mas veja agora como todos estão felizes e você subiu no conceito de velhos, jovens e crianças. O índio aparentou perdão, abraçou o tucano e o convidou para uma pescaria nas margens do rio Piquiri como antigamente, sem mágoas, sem rancor, mas tudo era grande mentira!

Tamanquaré armou uma maldade para a ave.

Lá, sentados na margem conversavam sobre tudo, alimentação, vôos, campinas, árvores frutíferas ao longo das margens do rio Piquiri, pinhas maduras, e agora os peixes serviriam para os dias de festas. Os dois ali, flexionados organizavam as flechas e as redes ainda toscas de pescaria.

O tucano deu as costas para o índio que pulou em cima, e com muita força puxou-lhe o bico esbravejando, seu tucano traidor, eu disse a você que nunca espalhasse o meu segredo de sentir medo de morrer deitado no chão batido para ninguém da tribo, criei a rede, uma invenção minha, só eu tinha direito de dormir protegido, e você não tinha nada que revelar o que eu falei para você, traidor! E cada vez que ele berrava esses impropérios para o tucano apertava-lhes o bico com mais e mais força, o tucano gritou por socorro mas ali, no meio dos arbustos, e das araucárias, quem ia escuta-lo? O índio mais forte ainda deu o último puxão com tamanha força que o tucano desmaiou de dor.

Quando despertou do desmaio, o índio estava sentado ao lado chorando amargurado, pensava ter morto o pássaro, mas quando viu o amiguinho mexer a cabeça, saltou de alegria, sorriu, chorou, pulou e o tucano ainda meio sem entender o que aconteceu, tentou perguntar no seu tom musical, o que aconteceu?

Logo percebeu que seu trinado nada mais era que sons guturais, não tinha mais ritmos, e que seu corpo pendia pra frente do peso do bico, olhando a fogueira acesa, sentiu o cheiro do peixe assando no rolete, pediu um pedaço ao índio que cantava de alegria por seu amigo estar vivo e ele ter se arrependido de tamanha malvadeza.

Tamanquaré tirou o melhor pedaço do peixe assado e entregou ao amigo que andava meio cambaleante, mas pensou, aquilo era moleza do tucano que nunca tinha levado uma boa surra de ninguém.

O tucano abriu o bico mas a sua garganta estava muito dolorida e estreita ao ponto que nenhum alimento conseguia engolir, o índio vendo o sofrimento do amigo, buscou pelas árvores os mais deliciosos e macios frutos e deu ao tucano que depois daquele dia nunca mais conseguiu comer outra coisa senão os frutinhos amarelinhos, vermelhinhos dos arbustos das curvas do rio Piquiri.

Lia Lúcia de Sá Leitão
Enviado por Lia Lúcia de Sá Leitão em 27/08/2009
Reeditado em 28/08/2009
Código do texto: T1778143
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