VINDICTA
A noite já caiu sobre a campina, o vento fustiga os prados, a chuva cai com violência a inundar os baixios das matas virgens, nenhuma estrela nos céus, tudo é sombra, tudo é melancolia. Lá bem longe se avista uma casinha de sapé.
Há alguns anos morava naquele lar um caçador. No alto da noite a teia de sua vida foi cortada por inimigos traidores. Perto uma casinha ergue-se sobre pedras uma cruz onde seu corpo repousa, à beira de um brejo onde as taboas crescem ao sopro dos ventos em noites infindas daquele sertão.
Nas paredes da casinha o limo se estende, aves fizeram seus ninhos nos buracos da cobertura de sapé. O mato crescido no quintal parece repetir o drama que ali se passou, os gritos do silêncio encerram angustias e fúnebres dores.
Não distante, uma sofrida criatura enrolada em cobertas puídas olha com amargura a noite fria, escuta o vento sibilante que fustiga as pradarias. Triste figura a jurar vingança pela perda de seu pai. Recostado no fogão aviva o fogo a crepitar enquanto lustra uma arma enferrujada e a muito manchada do sangue do velho.
Aos seus pés um velho cão dormita roncando surdamente, antigo companheiro do caçador. Talvez sonhe seguir seu dono nas profundezas da mata fria.
Então de súbito o som de uma buzina de caça ecoa e bate à porta do casebre depois se perde na pradaria. O cão se eleva nas patas dianteiras e o moço deixa cair a arma. De pronto o espectro ensangüentado de seu pai se faz presente e caminha na medonha noite.
O moço empunha a arma e adentra a escuridão, avança na mata e desaparece. Segue o som da buzina assassina.
Antes do amanhecer volta ao casebre. A chuva forte ainda cai, relâmpagos cortam o céu. Abre a porta e um turbilhão de vento invade a choupana.
O cão parece rejuvenescido, corre e late alegremente. O moço sacode as pesadas roupas e aviva o fogo que ilumina seu rosto. O sangue mancha o seu rosto e suas mãos. Tem expressão de alegria e alívio de missão cumprida.
Abre seu alforje e joga sobre a mesa o troféu da mais soberba caça da sua vida...