Acampamento de verão
Em um tempo muito, muito distante, quando ainda não se usava sacolas plásticas para carregar-se as compras do supermercado, quando os pães vinham em sacos de papel de cor parda e as carnes de açougue vinham enroladas em jornal, nos estabelecimentos mais populares, ou em papel de rolo, de uma cor avermelhada, nos estabelecimentos mais chiques, uma turma de jovens barulhentos e festeiros, reunia-se em um clube da cidade das belezas naturais, onde havia locais para acampar, com boa infra-estrutura: árvores, banheiros com chuveiros elétricos, mesas e churrasqueiras, campos de vôlei e futebol, canchas de bocha e, ainda, um belo e refrescante rio de águas limpas, puxando a uma tonalidade verde esmeralda. Nesse local, muito mais paradisíaco do que posso descrever, os jovens montavam suas barracas e passavam dias e noites tocando violões e fazendo cantorias, tomando cerveja, contando causos, namorando... Gostavam do local, pois normalmente apenas jovens acampavam lá, principalmente durante os dias úteis, em que eles todos, estudantes em férias, podiam gastar suas energias e fazer algazarra sem que vizinhos reclamassem. Por dois ou três anos, nos verões, foi assim... Até que um aposentado, residente em uma cidade vizinha, resolveu associar-se ao clube e então acampar no local. O coroa veio ao camping de “mala e cuia”, ou seja, trouxe toda a mobília de sua residência, montou um daqueles barracões enormes, que acomodam duas famílias de ciganos, e guarneceu o acampamento com geladeira, fogão, sofás em uma área coberta com lona de caminhão, televisor e até uma lavadora de roupas. Com ele também estava a esposa, uma senhora baixinha, pelancuda, do tipo ex-gorda, que passava assistindo novela na área do acampamento... Não perdia uma, assistia o vale a pena ver de novo, a novela das seis, das sete e das oito. Como a rapaziada já estava acampada não alteraram sua rotina de churrasco, bebidas e violão. Porém, já na primeira noite em que o inesperado casal aportara no camping, começaram as reclamações a respeito do barulho. De um lado os velhos noveleiros, de outro a turma de jovens. Os jovens, sensatos na primeira reclamação, diminuíram o volume das conversas e das canções... No segundo dia os novos visitantes já começaram a se queixar de barulhos no horário da novela da tarde, o que causou certa indignação no grupo de adolescentes. À noite o presidente do clube foi ao local de acampamento e ditou regras de silêncio como as usuais em condomínios ou conjuntos habitacionais, mesmo estando a barraca dos queixosos a mais de cem metros de distância do acampamento do grupo de jovens. A meninada, no dia seguinte, transladou o acampamento para o local mais distante possível e, mesmo assim, os aposentados continuaram com suas queixas, culminando em ameaças presidenciais de expulsão do clube caso o horário de silêncio não fosse respeitado. Assim, um local bacana, tornou-se monótono, sem sal, até que um dos jovens encontrou uma cobra, de uma espécie bem venenosa, conhecida como cruzeira, parenta bem próxima da esposa do aposentado, e a matou com uma paulada. Um dos garotos, então, enrolou a cobra, que tinha mais de metro e meio de comprimento, e a embalou em um daqueles papéis avermelhados de açougue e, na maior cara de pau, foi até o acampamento dos sempre queixosos aposentados e ofertou o pacote, dizendo que era uma lingüiça e que era presente para selarem a paz. O velho agradeceu e guardou a lingüiça na geladeira, dizendo que assaria à noite. Na manhã seguinte, quando os jovens acordaram, não viram nem sinal dos velhos no clube e, pelo que se sabe, eles devolveram o título social e nunca mais foram vistos nas imediações...
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