Curriculum

Ele era um cara perfeito. Ou melhor, sem defeitos. Tanto faz. Ao menos, era essa a impressão que todos os que o conheciam tinham dele. Era tido como o exemplo a ser seguido e na vizinhança era tratado respeitosamente sempre com um senhor antes do nome. Do tipo caladão, mas bem alinhado, buscava mostrar o lado bom da vida e, se algo dava errado, dizia, dando de ombros, que aquilo aconteceu “porque ele quis”. Não acreditava no acaso e defendia a filosofia de que era melhor aceitar silenciosamente a culpa no lugar dos outros, até a dos subalternos, que assumir o papel de cobrador chato. Talvez, por ser assim, era o primeiro a ser procurado quando alguém estava em apuros. Praticamente fazia milagres para solucionar os problemas alheios. Considerava-se uma pessoa feliz e trabalhava quase todos os dias da semana. Mas escondia um segredo que o envergonhava, uma mancha em seu currículo, que carregava quieto, na esperança de que ninguém notasse. No trabalho, apenas um software criado por ele insistia em não fazer o que fora programado. Frustrado, olhou para a tela e resolveu chamar o software de “Satã”.

(Esse texto ambíguo foi escrito por Jefferson Luiz Maleski na solidão (diurna) do dia dos namorados de 2009.)