Carolina sentia a saudade grudar-se à pele como uma roupa molhada. Muitas vezes não conseguia adormecer. O pensamento martelava as cenas dos encontros à exaustão. Cada detalhe, palavra e gesto armazenados pela memória obcecada do seu desejo.
Todos os dias eram ausência. E o tempo se arrastava em um calendário marcado pela mesma data. Abandonou-se em um estado de letargia, à margem de tudo.
Olho para ela agora. O ar desamparado e distante comove a ponto de querer resgatá-la. Porém, a névoa se esvai e emerge a arrogância infantil, enjaulada pela frustração de não tê-lo mais ali.
Carolina tenta convencer-se que é amor. Embora não saiba que a maior fragilidade amorosa é a consciência de que o outro não nos pertence. É livre, inclusive, do afeto que possa despertar.
E, talvez, o nome deste sentimento atormentado fosse ódio por desejá-lo além da sua própria vontade.
Muito tempo depois da alma cortada pelo vazio, a reencontrei. Saímos algumas vezes até que, naquela noite, pediu para não procurá-la mais.
Do outro lado da rua, uma festa. Abriu a porta de casa sem perceber que os sinais da alegria entravam com ela. A música misturada às gargalhadas e vozes.
No entanto, seu silêncio ressentido tornou insuportável ouvir a vida e Carolina transformou-se em rascunho de si mesma.
Antes de ir embora, vislumbro a sombra de seu corpo na parede. Uma figura estática entre os móveis da sala de jantar.
(*) Foto: Google
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