O PECADO DE ELISA

Era domingo. Elisa acabou de almoçar, olhou pela janela e viu um lindo dia. Na varanda, a rede esperava por ela. Recostou-se e, sem quê nem por que, começou a recordar a infância. Sempre que viajava por esse terreno, lembrava o fato mais remoto; nos braços de uma benzedeira, levando batidinhas de ramos bentos para curar-se de mau olhado e vento virado. “Sai espírito imundo”, dizia a velha. Elisa devia ser muito novinha! Como consegue lembrar-se de tantos detalhes!!

Hoje, lembrou-se de um fato que mais marcou sua infância (ou sua vida?). Alias nem gosta de lembrar, mas lhe vem sempre à mente. Tinha uma amiguinha de sua idade, cinco anos, vizinha. O pai era dono de uma casa comercial e no fundo de grande quintal ficavam enormes caixas de madeira que transportavam mercadorias. Nelas gostávamos de brincar de pique - esconde e outras brincadeiras... Certo dia o irmão da Lia convidou Elisa para “fazer bobagem”. Ela foi e gostou da brincadeira. Só que, dias depois, a amiguinha lhe contou que, “fazer bobagem”, era o maior pecado do mundo. Elisa ficou triste e “encucada”. Como pode uma coisa tão gostosa, tão boa, ser pecado?! Todavia, Elisa não queria pecar nunca. Não perdia as aulas de catecismo, queria se santa como Santa Terezinha! Pensou: - “Preciso confessar-me”. Mas, como? Nem tinha feito a primeira comunhão. Uma noite, indo a igreja com sua mãe, viu uma fila enorme de crianças que iam se confessar para a primeira comunhão. Enquanto a mãe rezava o terço, Elisa, escondida, entrou na fila das crianças. Tinha apenas cinco anos. E, quando, o padre perguntou pelos pecados, Elisa foi logo contando a brincadeira. O padre, muito sério, confirmou ser aquilo um grande pecado e que, muitas crianças preferiam morrer a contrariar as ordens de Deus. E citou vários mártires, todos canonizados e santos. A pecar contra a castidade, é preferível morrer! Nisto sua mãe, já descobrindo sua fuga, falou com o padre que ela não tinha idade para fazer a Primeira Comunhão. O padre, chamando-a, novamente, ao confessionário perguntou-lhe: - “Se eu lhe der um crucifixo com o Cristo e partir a cruz, o Cristo morre”? Respondeu logo que não – porque Cristo era Deus e Deus não morria. O padre chamou sua mãe e disse-lhe que Elisa estava preparada para a Primeira Comunhão que seria no dia seguinte. A cerimônia foi no cinema pois a igreja estava em construção. Todas as crianças de branco, véu e vela na mão, em fila. Só Elisa de casaquinho vermelho, pois não tinha roupa branca. O altar, no alto, e as pessoas na platéia, para assistir a comunhão. Diz a mãe que só viu um casaquinho vermelho pegando fogo. A menina atrás de Elisa colocara fogo no seu véu. Foi um horror! A mãe derrubando pessoas para passar e o padre abafando Elisa com seu manto. Felizmente não se queimou! Foi só um grande susto! Jamais Elisa se esqueceu desses momentos marcantes de sua infância. Mas, uma coisa foi por demais importante em sua vida. A partir desse momento Elisa abafou, reprimiu qualquer centelha de energia que pudesse aparecer no seu corpo. Esta energia maravilhosa, presente de Deus, com a qual somos dotados para o poder criador. Depois daquela confissão Elisa nunca mais deixou de confessar só estes pecados, durante anos e anos: - “Desobedeço ao papai, desobedeço à mamãe, brigo, falo mentira e juro”. Elisa nunca esqueceu também, a maravilhosa sensação de paz, a presença real de Deus no seu coração, quando fez a Primeira Comunhão. Durante anos e anos foi repressora até que um anjo cochichou no seu ouvido: - “Liberte-se Elisa! Você é livre para usufruir de tudo que Deus lhe presenteou”. Elisa, então, sentiu-se humana, gente, bastante redimida, por ter brincado de “fazer bobagem”.

Maria Eneida
Enviado por Maria Eneida em 07/05/2009
Código do texto: T1580205
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