A FILHA DO AVÔ
Ela nasceu nove meses após o incesto. Sua mãe tinha quatorze anos e três meses quando foi molestada pelo próprio pai, que, sabendo da gravidez da filha, tentou convencê-la a abortar.
A mãe da garota, temendo represálias, pois o marido era um homem violento, e tentando resguardar a família de um escândalo generalizado, também era a favor do aborto. Alegava que tirando o feto ainda pequeno, não estaria cometendo crime algum, pois ainda não era gente. A garota recusou-se a abortar. Ela não temia a justiça do homem, mas sim a de Deus, já que estaria cometendo um pecado bem maior que o primeiro, quando permitiu que o pai a possuísse: estaria tirando a vida de um pequeno ser, indefeso e inocente.
Ao saber do ocorrido, parentes da garota, contrariando os apelos da mãe da adolescente, denunciaram o pedófilo à polícia. O homem foi preso, mas, antes que fosse a julgamento, “convenceu” a esposa a retirar a queixa. Disse-lhe que se ela atendesse ao seu pedido, ele as deixaria em paz (ela e a filha) mudando-se para outra cidade. Caso a denúncia contra ele não fosse retirada e ele fosse condenado, quando ganhasse a liberdade, daria cabo das duas. A queixa foi retirada e ele cumpriu o prometido: mudou-se para outra cidade sem ao menos se despedir. Dele não se teve mais notícias.
Meses mais tarde ela, a filha do avô, nascia: linda, robusta, cheia de saúde. A mãe teve complicações na hora do parto (eclâmpsia) e não resistiu. Tinha apenas quinze anos a pobre moça. A bastarda foi criada pela avó e cresceu sem conhecer o pai. Diziam que ele morrera logo após o óbito da mãe.
Aos treze anos e meio era uma das mais belas garotas do colégio, da rua, da cidade... Por onde passava, não tinha quem não a olhasse, quem não a cortejasse, quem não a desejasse, apesar da pouca idade. Era inteligente e muito dedicada aos estudos; atenciosa para com todos; meiga e carinhosa para com os amigos. Um anjo, segundo os que a conheciam, porém indiferente para com a avó.
Era grande o número de garotos que batiam à sua porta querendo cortejá-la; eram constantes os “foras” que costumava dar nos pretendentes, pois nenhum lhe chamava a atenção por serem muito jovens. Carregava dentro de si um grande segredo: a atração por homens bem mais velhos que ela.
Certa vez fora flagrada, após a aula, aos beijos com o professor de Educação Física. Por se tratar de reincidência, ambos foram punidos: o professor fora transferido para outra escola; ela recebeu suspensão por uma semana. A avó-mãe, envergonhada, solicitou a transferência da menina e mudou-se para outra cidade.
Chegando ao novo domicílio, a rotina de assédios e cortejos reiniciou-se, pois eram irresistíveis a beleza e a simpatia da moçoila. Também continuavam constantes suas esquivas.
O tempo foi passando e ela ficando mais encorpada, mais encantadora, mais sensual... Tinha já quinze anos, idade da mãe quando lhe dera à luz. A essa altura, a avó não mais tinha domínio sobre a neta, que saía todas as tardes e só retornava à noite, sempre com a mesma desculpa: ir à casa de uma amiga para fazer trabalhos da escola.
Numa dessas saídas, a menina ligou para a avó dizendo que iria dormir na casa da amiga, pois já estava tarde e ela precisava terminar o trabalho ainda naquela noite, o qual deveria ser entregue no dia seguinte. Muito a contra-gosto a avó permitiu que ela ficasse por lá somente aquela noite.
No dia seguinte, a garota retorna a sua casa e, sem nada falar com a avó, dirigi-se ao seu quarto. Preocupada, a avó vai atrás da menina e percebe que, debruçada sobre a cama, a menina chora. Pergunta-lhe o que aconteceu, qual o motivo do choro, o que fizeram com ela. Em soluços, a menina conta à avó que acordou no meio da noite com o pai da sua amiga tirando-lhe a roupa. Tentou gritar, mas o homem tapara-lhe a boca e fez-lhe ameaças, o que a fez não mais resistir e entregar-se àquele homem, com idade de ser pai, ou quem sabe seu avô. Tentando consolá-la, a avó afaga-lhe a cabeça e pergunta o nome do homem. A menina diz o nome do moço à avó, diz ainda que nada devem fazer, pois ele é uma pessoa muito perigosa. Trata-se de um contraventor, banqueiro do jogo do bicho, o qual, inclusive, já foi preso, acusado de ter molestado a própria filha alguns anos atrás, lá na cidade onde moravam.
Ao ouvir o relato da menina, a avó quase desmaia. À sua mente veio o filme do seu passado: as angústias ocasionadas pela gravidez da filha, provocada pelo próprio pai; a prisão do marido e suas ameaças; o nascimento da neta e, conseqüentemente, a morte da filha. Era a mesma pessoa, o mesmo homem, o mesmo pecado, o mesmo crime. Novamente o pai molesta a filha, dessa vez sem saber quem era ela, mas não deixava de ser um crime inafiançável, inaceitável, imperdoável...
Ela, a avó, pensou em fazer justiça com as próprias mãos, mas lembrou-se a tempo de que se desse cabo daquele “animal”, ela seria presa e sua menina ficaria só no mundo. Resolveu, então, na companhia da neta, denunciá-lo à polícia. O homem foi preso, julgado e condenado.
A avó e sua menina, temendo o pior quando da saída daquele homem da prisão, mudaram-se de cidade mais uma vez. A avó, levando a certeza de que a justiça foi feita; a neta, levando no ventre mais um filho do avô.