Quatro estações na varanda

Sentou-se na varanda de casa com a taça de vinho à mão. Deixou, distraída, que corressem alguma lágrimas sobre as bochecas rosadas pela bebida. Gostava de sentir a brisa fresca das noites de primavera. Gostava do cheiro de damas da noite, da maresia e do sereno.

Lembrou-se de certa noite que, também na varanda, passara horas sentada. A extasiante brisa lhe fazia ficar a delirar, imaginar. Era esperançosa, apaixonada, mas não se lembrava direito dos detalhes de suas fantasias. Estava verdadeiramente distante de sua realidade. Só se lembrava da música, ao fundo, embalando os pensamentos. A letra descrevia sua história. A melodia acentuava o sofrimento, a saudade, a lamúria. Impulsiva, explosiva. Cheia de vontade e de energia para buscar seu desejo. Mas querer nem sempre é o que basta, o mundo dá voltas e alguns planos não pintam realidade, estampam apenas projetos.

Hoje, sentada ali, concluía o quão calejada estava de todo aquele almejar. Não mais alimentava esperanças. Há algum tempo havia desistido de suas fantasias - ainda que em alguns momentos elas teimassem a atormentar-lhe as idéias. Travada sua batalha, impôs a si aceitar seguir em frente.

Pois, lá na varanda, sentada com a taça de vinho à mão, a garota divagava em seus pensamentos. Tentou se abstrair de todos eles, mas sua hiperatividade não lhe permitiu. Levantou um pouco, cantarolou junto à música que tocava, e outra lágrima escorreu pelas bochechas.

- Amoooooor? Vem pra varanda!

- Que foi?

- Te amo.

Sorriu, abraçou-o e caminharam em direção à sala.

Sabia que os tombos faziam parte de seus trajetos, e era importante notar os pequenos gestos que a ajudaram a levantar. O tempo e o amor cicatrizaram feridas. As marcas tornam-se sua história e muito de tudo aquilo é hoje.