CERTA FEITA EM PARIS - Lia Lúcia de Sá Leitão - 11/04/2009

Certa feita, estava eu e um amigo em passeios por Paris, resolvemos visitar o Museu do Louvre. Conferimos todos os roteiros e partimos para a enriquecedora visitação. Tudo era muito belo e interessante mas as nossas atenções estavam voltadas para a Monalisa, o menor das maiores obras já realizadas no mundo.

Eterno foi o tempo que passamos ali, ela nos olhava sem grandes interesses, e, nós a admirávamos como dois patetas. O resto das coisas depois daquela maravilha seria apenas complemento.

Na saída Tutuca olhou na direção do rio Sena e exclamou. Se eu tivesse a fortuna que vale essa obra eu compraria e colocaria na sala do meu castelo!

Eu fiquei meio tonta com tamanha declaração; porque se eu tivesse toda aquela fortuna, teria outras prioridades, aquela tela o melhor local era a parede do museu! Pode até parecer ignorância mas existem coisas velhas que servem para o lixo, outras para colecionadores e outras para museus, fora dali, não teria a graça nenhuma, o mundo todo curioso pagando fortunas por visitações, não deixaria de ser uma obra condenada a uma parede exclusiva de castelo com um rigor de alarme para a INTERPOL, FBI, POLÍCIA FEDERAL, CIA, KGB, 007, MANDRAQUE, até a tropa de choque brasileira e a cavalaria da rainha da Escócia, guarda pretoriana ficariam de alertaenfim um monte de polícia que não sei escrever o nome nem vou procurar no Google..

Olhei e disse que eu não tinha o menor interesse de tê-la pendurada na parede da minha casa, primeiro que todas as vezes que olhasse para o quadro teria a impressão de que aquele olhar desdenhoso estava ali fazendo uma eterna gozação da minha cara, estava sempre olhando de alto abaixo e pensando lá entre as traças e as tintas envelhecidas pelo tempo... olha pra mim, veja, tenho séculos e continuo jovem, bela, sarcástica, orgulhosa, desdenho de vocês pobres seres enrugados, candidatos ao esquecimento numa sepultura sob a inscrição, aqui jaz, ou aqui já foi a fulana de tal.

Nem pensar! Queria aquela medonhenta na parede de minha casa estava claro naquele risinho irônico a eterna afirmação: eu sou quem sou porque vocês jamais desvendarão o meu mistério.

Eu lá quero ferver o meu juízo! Haja ovário! Ousadia ser obrigada comprar um programa de computador que dá resolução em segundos de quantos homens a Mona poderia ser, se ela era ELA ou o artista brincando de traveco, não me queiram mal os traveco, na verdade o despeito de mulher de meia idade e sem coragem de fazer plástica dá nesses abusos literários.

Mas, Tutuca desde sempre azucrinou meu juízo que ir a Paris sem trazer um biscuit da Torre Eifell, um chapéu Coco e um frasquinho de Chanel 5, mais ums vários envelopes de fósforos dos cafés, hotel e boites, sem contar a tradicional cópia da Mona era pura inapetência de status de classe média para rica, aquele velho estrato social ou transição social, digamos novos remediados um degrau abaixo de novo rico.

Pois, sem delongas, saímos do Louvre.

Eu, essa que vos escreve, foi direto comprar umas estampas de um ilustre pintor desconhecido, sorridente coisa incomum aos franceses, disse-me tenho obras em todo o mundo, e eu apontei o Louvre e perguntei, tem alguma exposição prevista lá? Ele riu aguado e disse ali só para os mestres descobri que ele não era francês e sim brasileiro, por isso paguei quase todas as telas expostas ali, pois comprei de tudo inclusive as três da MONALISA, foram grátis, hoje deduzo que ninguém as comprou e ele superaturou nas outras telas, deduzam minha raiva hoje ao lembrar que não podemos fazer festas com conterrâneos do outro lado do Oceano, ( nem todos é claro, grifo da autora).

Sabe de uma coisa, senti dó daquele artista, pois olhei com os olhos críticos de simples mortal e não achei que o artista fosse um borra botas que nem essas tranqueiras que assistimos de vez em quando e fazemos carinha de paisagem cut num oh!!!

Vocês sabem do que escrevo, aqueles que são coloridos não tem forma, não tem nada que comunique uma mensagem a não ser uma mistura entediada de borradeiras assimétricas, mais uma etapa de ignorância cultural, só gosto do que posso decodificar, uma vaquinha, um patinho, um burrinho com Jesus sentado no lombo do bichinho, aqueles santinhos distribuidos no dia de Ramos na porta da Matriz.

Adoro entender a pintura da torre Eifell mesmo que seja aquelas meio azuladas e tremidas, a estampa da Monalisa, uma ponte.

Não vou estender as explicações mesmo os que não se assumem como eu que modernidade não é esfregar pincel em tela sabem agora como penso.

Caríssimo leitor, falei para Tutuca, minhas telas infantis, minhas Igrejas de Olinda, o óleo sobre o por do sol em Fernando de Noronha que culminou em meio quilo de tinta na lona da tela e findou em flores tropicais, a casinha azul de madeira que copiei em Cascavel. Nada disso sairá das paredes da sala de jantar. As minhas telas enfeitarão as paredes principais , se quiser as estampas pode pendurar no seu quarto.

Ele riu e saimos brincando uma do outro.

Primeiro porque o apartamento que não dividimos é particular dele, segundo que ele podia dar um pé na minha bunda nem parente eu sou, e terceiro nunca passou pelas nossas dele vender e eu comprar.

- Agora sim! descobri o seu grande desejo.

- Qual?

- Você quer casar comigo!

- Eu? não seja doido. Você é meu grande amigo, meu irmão.

No fundo do meu coração eu estava gostando daquelas insinuações, na verdade existia um bem querer que ainda não estava bem definido na minha cabeça.

Nos jardins, ele andou mais rápido, fez uma mesura com a mão e perguntou-me muito sério.

- Quer casar-se comigo Princesa Genoveva?

A minha vontade era dizer sim! Eu quero sim, casar-me com você. Mas olhei como quem desdenha e respondi que NÃO. Mas o tom de voz foi com bastante raiva. Fechei a cara o resto da manhã. Por mais que ele brincasse, não queria papo. Chegamos até a brigar feio.

Os dois não tinham idéia do motivo da discursão, resolvemos como adultos passar um tempo distante um do outro, tanto tempo passamos programando essa viagem e por causa de uma tela que nunca sob hipótese alguma pararia na parede de um apartamento meu era a causa de discórdia.

Eu fui direto para o Hotel, disparei como um canhão para o meu quarto, deitei-me e chorei como criança. Ele não sei que caminho tomou até a hora do jantar.

Adormeci, durante toda a tarde entre a solidão, o choro e os suspiros, só acordei com umas batidinhas de leve na porta do quarto, dei um pulo e era Tuca, de cabeça baixa, eu de nariz inchado, ele com duas rosas vermelhas e eu de cabelos assanhados e cara de travessei-ro.

- Posso entrar?

- Pode.

- Você chorou?

Pensei em negar e dizer que era gripe, mas essa desculpa já está tão velha que até o resfriado sarou.

- Eu fiquei com raiva de ter brigado com você. Chorei a tarde todinha!

- Eu também, não achei graça em nada que vi, na verdade nada tinha graça sem você do meu lado. Nós programamos tanto essa viagem que não vai dar para continuar sozinho.

- Foi você quem começou, peça desculpas, eu esqueço e nós vamos jantar como antes.

- Nada disso! Foi você quem comprou essa estampa e disse que era do meu quarto porque nas áreas comuns ficariam os seus quadros.

- Claro! Eu sou sua amiga, estou vivinha da Silva! Gosto dos meus quadros modernos. Pretendia dar de presente para você! Ou não posso?

- A intenção não foi essa!

- Você vai começar tudo novamente? Se for, eu não quero mais falar no assunto. Coloque a estampa numa moldura e coloque na sala de sua casa e não ganhará nenhuma tela minha e eu também não vou visitá-lo nem quando estiver doente!

- Tá bom! eu coloco a estampa no meu quarto e deixo as outras paredes para as suas telas! e a gente não toca mais no assunto, legal?

- Peça desculpas porque me fez chorar.

- Desculpe.

Num pulo só, dei um abraço e um beijinho no rosto dele, corri para o banheiro tomei uma chuveirada e saí prontinha como quem vai para uma festa.

- Para onde você vai tão bonita?

- Jantar com você. Foi o senhor quem bateu na minha porta com flores, pedindo desculpas e quando um rapaz pede desculpas dessa forma nos filme, convida a moça para jantar num restaurante chique.

- Tá bom!

Saímos felizes e saltitantes, tudo voltara ao normal.

Chegamos num lindo restaurante, sentamos pedimos o cardápio, nem eu nem ele conhecíamos a comida mas, era comida francesa, rimos da situação, porém aflitos, bebemos vinhos, comemos croissans torrados na maneiga com pasta de fígado de ganso, quando a comida chegou nada mais era que uma sopa sem cor, que podíamos mergulhar a colher e pescar um macarrão de conchinha, para quem estava com fome de alguma coisa sólida e de peso como as feijoadas e churrascadas do Brasil era de bom tamanho pegar o trem ainda naquela noite e partir para outro país que servisse comidinha caseira que formasse cocô.

Lia Lúcia de Sá Leitão
Enviado por Lia Lúcia de Sá Leitão em 11/04/2009
Código do texto: T1533590
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