Desventuras de um ex-boneco de neve IX
“Criança periférica teu mundo é um submundo” (autor desconhecido)
---Sabe de uma coisa? Perguntou Caolha. --Cansei dessa vida de migalhas, de ficar esmolando, pedindo no farol. Disse olhando para os restos da refeição que haviam feito.
--E nem foi tão difícil conseguir tudo isso. Pegou o último bolinho e o enfiou na boca. --Na verdade. Continuou --Foi fácil até demais.
---Mas, isso n... não é certo, né? Perguntou Lombriga timidamente.
---To me lixando pro que é certo. Respondeu com ferocidade.
--- ...
---Óia aqui Lombriga, cê não sabe de nada, e é melhor que aprenda a viver nesse mundão, mas não se preocurpe eu vou te ensinar. Sim, vamo ficar junto e mostra pra todos do que somos capaiz, vamo sim!
---Mas eu não quero fazer coisa errada Caolha.
---Errada??
---Sim, roubar coisas é errado.
---Hahaha! Mai essa é boa... É fácil dizer isso depois que o bucho tá cheio, né?
---Não deveria ter comido dessa comida. Falou o garoto olhando entristecido para os restos da refeição
---Deixa de cê bocó muleque, tamém pensava que nem ucê. Mai chega! Num quero mai saber du que é certo e du que é errado, quero cume coisas boa, como essa que acabei de cume, e pronto.
---Se for assim não poderei ficar com você, Caolha.
---O que cê ta falando?
---É isso mesmo.
---Num to entendendo, tu num vai embora, vai? Perguntou Caolha com um leve tremor na voz .
---Vou te contar uma coisa... O garoto tomou fôlego e prosseguiu. --Sabe, eu era um simples boneco de neve... E assim, Lombriga contou a Caolha toda a sua história. --Entende? Eu fui agraciado, me tornei um menino, um menino de verdade, e... eu seria muito mau se começasse a sair roubando por ai.
---Mas... Mas é pra cume Lombriga, todo mundo tem direito de cume, pelo menos cume, mai cume coisa boa, to cansada de pão velho, de restos.
---Teremos tudo isso e muito mais se tivermos uma mãe.
---Não seja idiota muleque! Gritou com raiva. --Já num disse que mãe não presta, só serve pra bater nos fíos.
---Você está enganada Caolha.
---Num to não!!! Caolha falava com tanta raiva que de sua boca saia gotículas de saliva. --Tá vendo meu olho. Disse apontando o olho inexistente. --Foi aquela vaca.
---Não! Disse Lombriga num murmúrio.
---SIM!!
---Eu sinto muito Caolha. Falou sentido -- Porque não vem comigo? Vamos procurar uma mãe que seja boa e brincalhona.
---Não!
---Mas Caol... Começou a dizer, mas foi interrompido pela voz impregnada de raiva da garota.
---Some daqui!! Vai! Tomara que ache mesmo uma mãe, uma que te bata que te faça trabaía dia e noite, vai! Disse isso atacando as embalagens e os restos da refeição nele.
Lombriga partiu com o coração em pedaços, mas mesmo com o coração assim ele sabia, sim, lá no fundo ele sabia que um dia iria encontrar uma mãe, uma mãe de verdade.