E ELA (RE)COMEÇOU AOS 40

Interessante como ele nunca havia parado para pensar na tão falada frase popular: "a vida começa aos 40". E então parou e pensou. Buscou no recôndito da memória todos os detalhes da sua vida antes dos 40 anos. Percebeu que até então tivera uma vida repleta, mas não completa. Fora uma criança feliz embora vivesse numa família de poucos recursos. Isso não importava na época, porque tinha quase tudo o que precisava. Um pai um tanto ausente, porém uma mãe muitíssimo presente, um irmão mais velho, familiares próximos, amigos, colegas de escola. Tinha brincadeiras de roda, jogava futebol na rua, fazia e empinava pipas, dançava quadrilha nas festas juninas da escola, passava férias na praia na casa dos primos e no sítio dos avós. E o mais importante, tinha sonhos. Mais tarde, na adolescência, ia a festinhas, muitas paqueras, esportes, viagens. Só alegria. Teve uma juventude curta, interrompida aos 20 anos com o compromisso do casamento. Logo vieram os filhos, um a um trazendo alegria espontânea e real. O tempo foi passando e sua vida foi sendo consumida de uma maneira voraz, como madeira à mercê de uma colônia de cupins. Responsabilidades com a família, o trabalho, a sociedade, escolas dos fillhos, contas para pagar, compras de supermercados, o consumo exacerbado, as cobranças do chefe no trabalho, da esposa e dos filhos em casa, dos amigos, dos credores. Ufa! A certa altura se perguntou: "para onde fora sua vida? Para onde foram os seus sonhos de menino? Onde estaria a tal felicidade que lhe fora prometida um dia em algum lugar? Será que era só sonho?" E com isso se passaram 19 anos. A vida passara pela janela à bordo de algum carro ou trem, quem sabe um avião ou navio, não importa, o fato é que passara e não fora notada, não fora vivida e parecia que tinha acabado. Que triste, a vida de um homem acabada aos 39 anos de idade, embora ele tivesse saúde e energia para viver muitos anos mais, porém era uma alma cansada, abatida, combalida, qual um boxeador após levar um cruzado de esquerda do adversário, estendido na lona, nocauteado. Ele havia se transformado em pó, ou melhor, em cinzas.

Foi então que uma luz brilhou, um sentimento estranho se apoderou dele e qual a ave fênix, levantou-se das cinzas e deu meu grito de liberdade: "independência e vida!" Libertou-se das correntes que o prendiam àquela vida medíocre e sem sentido, juntou os cacos e partiu em busca da felicidade. Mas como tudo tem seu preço, essa busca custou caro. A retirada estratégica da zona de conforto rumo ao desconhecido não fora tão fácil como parecia. O preço mais alto que pagou fora a ausência dos seus filhos pela distância, mas era necessário. Uma amiga relatou-lhe algo que ilustra muito bem esse episódio em sua vida.

Ela disse:

-Conta-se que a águia quando completa 40 anos está velha, com as penas caindo, o bico quebrado e as unhas tão grandes que já não consegue mais caçar para manter a sobrevivência. É então que toma uma dolorosa decisão. Voa para o lugar mais alto da montanha e lá, isolada, trava uma batalha consigo mesma. Precisa decidir entre sua morte e a continuidade da vida. Então ela decide que quer viver e se lança lá do alto sobre as pedras, provocando sérios ferimentos em si mesma. Quebra o bico e as unhas e fica seriamente machucada. Volta ao topo da montanha e lá, isolada novamente, espera o tempo passar, porque nada melhor do que o tempo para curar as feridas. O tempo passa, nascem novas unhas, um novo bico e novas penas, e a águia está pronta para voar e caçar de novo. Aos 40 anos de idade sua vida recomeça e viverá, quem sabe, mais uns 40. Que lindo exemplo para nós, seres humanos. Chega um momento em que temos de tomar uma decisão se queremos viver ou morrer, mesmo que só interiormente. Pense nisso.

-Pensarei com carinho - disse ele, entendendo a mensagem.

No seu caso fora necessária uma ruptura radical com tudo o que vivera até então para também poder recomeçar a vida aos 40, tal qual a águia. Desde então experimentou uma vida plena de alegrias, paz, lutas e vitórias. Encontrou pessoas maravilhosas, viveu experiências incríveis e se sentido vivo de novo, como o garoto sonhador de outrora.

Ivan De Lima
Enviado por Ivan De Lima em 08/04/2009
Reeditado em 08/08/2011
Código do texto: T1528310
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