Um recado do Além.

A rua estava escura e deserta àquela hora da noite.Apenas ouvia o bater do salto de sua bota sobre a calçada.Ouviu um farfalhar estranho e virou-se rapidamente,mas viu apenas um inocente gato pulando um muro ao lado.Suspirou aliviada e continuou seu caminho,agora em passos mais rápidos.Quando avistou o portão de sua casa sentiu-se melhor e até diminuiu o ritmo.Estava cansada e pensava num banho demorado com a água bem quente,do jeito que gostava.Tirou a chave da bolsa e sentiu um frio lhe percorrer a espinha quando viu o homem sentado na varanda.A chave caiu de suas mãos e soltou um grito se afastando para o lado.

-Não tenha medo Mariana,não vou lhe fazer nenhum mal.-O homem se aproximou em passos lentos e ela começou a gritar.

-Mariana,filha,acorde!

Abriu os olhos e viu sua mãe com olhar preocupado.Sentou-se,o suor lhe escorria pelo corpo.Era a terceira vez que tinha aquele pesadelo e com o mesmo homem.

-Foi apenas um pesadelo.Você está bem?

-O mesmo pesadelo mamãe.Estou ficando com medo.

-Deixe de bobagem.Você está trabalhando demais,só isso.

-Não.Eu sinto que tem alguma coisa.É como se ele quisesse me contar algo.Eu não consigo ver seu rosto,mas é sempre ele,com a mesma roupa e aquele jeito calmo de falar.É tão real.parece que ele quer me dizer alguma coisa.

-É melhor dormir minha filha.O dia já está amanhecendo e logo seu irmão vai acordar.Tente não pensar nisso,é uma bobagem.-Sua mãe beijou-lhe a testa e saiu fechando a porta.

Mariana permaneceu acordada.Não conseguiria mais dormir.Desde a primeira vez ,sentia que aquele homem que aparecia em seu pesadelo queria lhe dizer algo,mas não sabia quem era,não lembrava de ninguém que tivesse conhecido.Nenhum de seus pacientes se parecia com ele.O estranho era que sempre acordava quando ele ia lhe falar algo.Podia ser um recado,já tinha lido muito a respeito de espíritos que se comunicavam com as pessoas.Afastou a idéia,talvez sua mãe tivesse razão,estava trabalhando demais na clínica.Há semanas não tirava uma folga e acabava tendo pesadelos.

A clínica psiquiátrica estava situada numa região tranqüila da cidade.Os pacientes tinham um enorme jardim onde tomavam sol todas as manhãs acompanhados por enfermeiras.Mariana trabalhava como psicóloga e tinha um relacionamento bom com todos , desde funcionários até os pacientes que tratava.Quando comentou sobre o pesadelo com sua colega Jane,ela achou que devia tirar uns dias de folga,mas ainda aconselhou a procurar um centro espírita.

-Não deve ser nada,acho que só fiquei impressionada.

Depois do expediente voltou para casa de ônibus como sempre fazia.Estava anoitecendo.Desceu no ponto e seguiu a pé os dois quarteirões até sua casa.Ao subir as escadas sentiu algo estranho.Parou na varanda e olhou para a cadeira de balanço.Estava vazia,mas balançava lentamente,como se alguém impulsionasse com o corpo."Pare com isso,é apenas sua imaginação,não há ninguém aí."

Abriu a porta e entrou rapidamente.Sua mãe cantarolava na cozinha enquanto preparava o jantar.

-Olá,que alegria é essa?-Beijou-lhe o rosto sorridente.

-Oi querida.Estou me sentindo feliz e em paz comigo mesma.O jantar está quase pronto!-e continuou a cantoria.

-Vou tomar um banho e já volto.

Naquela noite o sonho foi diferente,estava passeando num parque e alguém a chamou.Voltou-se e viu o mesmo homem que se aproximava em passos lentos.Procurou manter a calma,desta vez não fugiria.Quando ele se aproximou,ela finalmente viu seu rosto.lembrou das fotos,era seu pai que havia falecido quando ainda era bebê.Ele sorriu e chamou alguém,foi então que sua mãe apareceu.Ela estava vestida toda de azul e parecia flutuar no ar.Por um momento não soube o que dizer, então seu pai falou:-Não tenha medo minha filha,eu e sua mãe vamos cuidar sempre de você!Eu apenas quis que ficasse preparada,jamais quis assustá-la.Sou seu pai,você era um bebê quando parti,por isso não lembra de mim.Vim buscar sua mãe para ficar comigo,mas estaremos sempre com você!"

E então sua mãe lhe sorriu e se afastaram de mãos dadas.Mariana acordou e sentou-se na cama.Seu corpo todo tremia e suas mãos estavam geladas."Foi apenas um pesadelo,apenas um pesadelo." Levantou-se para beber um copo de água.Ao passar pelo quarto da mãe sentiu a necessidade de realmente ter certeza que tudo estava bem.Empurrou a porta lentamente e viu que ela estava deitada,um sorriso estampado no rosto.Por um momento pensou em sair para não acordá-la,mas ao se aproximar teve a certeza que ela jamais acordaria.