fonte imagem: jacacarambola.wordpress.com/.../
Este é um mini-conto não vencedor, mas selecionado como concorrente no final de 2008, em um concurso da categoria e que me deu muita alegria.
ME DÊ UMA TV, QUE EU ME CASO COM VOCÊ
No auge dos seus vinte e oito anos, Leda estava enfastiada com a vida que levava. Já havia se casado por duas vezes e seus casamentos só duraram o tempo da empolgação. Como lembranças boas, desses casamentos, restaram-lhe apenas as duas filhas Marcela, Giovanna.
Leda realmente estava cansada. Sua infância não tinha sido fácil. Começou a trabalhar, aos seis anos de idade, lavando louças na casa da patroa de sua mãe e não queria isso para suas filhas. Suas filhas era o único presente bom que recebera da vida. Decidira, desde o dia dos seus nascimentos, lhes preservar a infância. Filha sua não subiria em banquinho algum para alcançar uma pia lotada de pratos e copos sujos. Leda nunca freqüentou uma escola. Também não pensava e nem se importava com isso. Sabia ler e escrever porque aprendera nas aulas da escolhinha de brincadeira das três filhas da patroa, quando não tinha algum trabalho a fazer. Agora, sentada na soleira da porta, lembrara de Fernanda. Fernanda era a professora dessa escola de mentirinha. Eram muito amigas e sempre tinha novidades para contar e ensinar. Fernanda a ajudava, muitas vezes, nos afazeres para sobrar mais tempo para as brincadeiras. Fernanda era uma professora brava.Leda nunca se esquecera da bronca tomada quando aprendera escrever a letra “L”, em letra cursiva. Fernanda, muito séria no seu posto, disse para ela:
- Nunca se esqueça Leda, o “L” é uma bailarina. Uma bailarina, viu? É a primeira letra do seu nome.
Leda teve um acesso de riso. Não enxergava a bailarina, mesmo Fernanda se esforçando numa infinidade de desenhos de bailarinas mirabolantes com a letra “L”. Fernanda ficou tão zangada, a ponto de expulsá-la da sala de aula. Onde estará Fernanda, agora?, pensou ela com uma ponta de saudade. Mas logo espantou essas lembranças, dizendo para si mesma: – “deixa pra lá, ela nem deve se lembrar de minha existência.”
Marcela e Giovanna chegaram correndo e sentaram junto à Leda, na soleira da porta. Não demorou as duas iniciarem uma discussão na luta pelo lugar mais juntinho da mãe.
Leda perdeu a paciência expulsando-as dali.
- Saiam já daqui. As duas de castigo lá no quarto. Sentadas na cama, ouviram?
Não demorou a sensação de culpa dominar o coração de Leda. Sua consciência cobrou-lhe a atitude tomada. Por tão pouco, ela havia perdido a paciência. Pensou então: se eu tivesse uma televisão, isso não aconteceria, mas cadê dinheiro para comprar uma?
Televisão sempre fora o seu sonho de consumo. Adorava novelas porque se sentia parte delas. Sentia-se a própria protagonista dos enredos. Esse gostinho ela tinha todas as tardes na hora de passar as roupas da casa onde trabalhava. Bem no seu intimo, namorava e apaixonava-se pelo galã, acreditando ser ele o seu verdadeiro namorado.
Um luz veio à cabeça de Leda. Lembrou-se de seu Januário. Um velho viúvo que estava à procura de uma nova companheira. Seu Januário era um pouco velho. Aliás, quarenta e dois anos mais velho do que ela. Não era um homem bonito. Era aposentado, tinha uma casa, a pensão do INSS e tinha uma TV. E seu Januário, por inúmeras vezes, já havia se engraçado para o lado dela, mas ela nunca lhe deu bola. Foi quando bronqueou-se consigo mesma:
- Como nunca me lembrei disso? O homem tem uma TV? Se caso com ele, vou poder assistir o que quiser, na hora em que eu quiser e as meninas vão poder se divertir.
Não pensou duas vezes. Tomou um banho gostoso. Colocou a melhor roupa.Passou um batom vermelho na boca e lá foi ela bater na porta da casa de Januário com o propósito de convidá-lo para tomar uma cerveja.
Januário assustou-se ao abrir a porta. Não podia acreditar naquela cena. Uma moça bonita, novinha e tantas vezes assediada por ele convidando-o para sair. O coração do pobre velho estava na boca. Então ele lhe disse::
- Pra sair com uma moça tão bonita eu preciso me arrumar.
Ao fechar a porta, mudou de idéia:
- Vamos ficar aqui mesmo. Aqui é melhor de conversar. Tem cerveja na geladeira e ninguém para atrapalhar.
A TV estava ligada. A sedução das imagens deixou mais claro o propósito de Leda e, sem titubear, Leda foi logo disparando no assunto:
- Januário! Quero me casar com você, mas tem uma condição. Eu quero uma TV para o nosso quarto e uma TV para o quarto das minhas filhas.
O peito de Januário parecida querer explodir. Podia ouvir a força das batidas de seu velho coração.Na altura dos seus setenta anos, ele não desperdiçaria, jamais, aquela oportunidade de se enroscar na pele macia e vibrante de juventude lhe ofertada, só por causa de duas TVs.
Naquele mesmo dia, Leda e as meninas se mudaram para a casa de Januário. Na semana seguinte, as TVs já estavam lá. Alguns meses depois, casaram-se de papel passado. Depois disso, mesmo na hora do vamos ver, naquela casa, não se desliga a TV.
Este é um mini-conto não vencedor, mas selecionado como concorrente no final de 2008, em um concurso da categoria e que me deu muita alegria.
ME DÊ UMA TV, QUE EU ME CASO COM VOCÊ
No auge dos seus vinte e oito anos, Leda estava enfastiada com a vida que levava. Já havia se casado por duas vezes e seus casamentos só duraram o tempo da empolgação. Como lembranças boas, desses casamentos, restaram-lhe apenas as duas filhas Marcela, Giovanna.
Leda realmente estava cansada. Sua infância não tinha sido fácil. Começou a trabalhar, aos seis anos de idade, lavando louças na casa da patroa de sua mãe e não queria isso para suas filhas. Suas filhas era o único presente bom que recebera da vida. Decidira, desde o dia dos seus nascimentos, lhes preservar a infância. Filha sua não subiria em banquinho algum para alcançar uma pia lotada de pratos e copos sujos. Leda nunca freqüentou uma escola. Também não pensava e nem se importava com isso. Sabia ler e escrever porque aprendera nas aulas da escolhinha de brincadeira das três filhas da patroa, quando não tinha algum trabalho a fazer. Agora, sentada na soleira da porta, lembrara de Fernanda. Fernanda era a professora dessa escola de mentirinha. Eram muito amigas e sempre tinha novidades para contar e ensinar. Fernanda a ajudava, muitas vezes, nos afazeres para sobrar mais tempo para as brincadeiras. Fernanda era uma professora brava.Leda nunca se esquecera da bronca tomada quando aprendera escrever a letra “L”, em letra cursiva. Fernanda, muito séria no seu posto, disse para ela:
- Nunca se esqueça Leda, o “L” é uma bailarina. Uma bailarina, viu? É a primeira letra do seu nome.
Leda teve um acesso de riso. Não enxergava a bailarina, mesmo Fernanda se esforçando numa infinidade de desenhos de bailarinas mirabolantes com a letra “L”. Fernanda ficou tão zangada, a ponto de expulsá-la da sala de aula. Onde estará Fernanda, agora?, pensou ela com uma ponta de saudade. Mas logo espantou essas lembranças, dizendo para si mesma: – “deixa pra lá, ela nem deve se lembrar de minha existência.”
Marcela e Giovanna chegaram correndo e sentaram junto à Leda, na soleira da porta. Não demorou as duas iniciarem uma discussão na luta pelo lugar mais juntinho da mãe.
Leda perdeu a paciência expulsando-as dali.
- Saiam já daqui. As duas de castigo lá no quarto. Sentadas na cama, ouviram?
Não demorou a sensação de culpa dominar o coração de Leda. Sua consciência cobrou-lhe a atitude tomada. Por tão pouco, ela havia perdido a paciência. Pensou então: se eu tivesse uma televisão, isso não aconteceria, mas cadê dinheiro para comprar uma?
Televisão sempre fora o seu sonho de consumo. Adorava novelas porque se sentia parte delas. Sentia-se a própria protagonista dos enredos. Esse gostinho ela tinha todas as tardes na hora de passar as roupas da casa onde trabalhava. Bem no seu intimo, namorava e apaixonava-se pelo galã, acreditando ser ele o seu verdadeiro namorado.
Um luz veio à cabeça de Leda. Lembrou-se de seu Januário. Um velho viúvo que estava à procura de uma nova companheira. Seu Januário era um pouco velho. Aliás, quarenta e dois anos mais velho do que ela. Não era um homem bonito. Era aposentado, tinha uma casa, a pensão do INSS e tinha uma TV. E seu Januário, por inúmeras vezes, já havia se engraçado para o lado dela, mas ela nunca lhe deu bola. Foi quando bronqueou-se consigo mesma:
- Como nunca me lembrei disso? O homem tem uma TV? Se caso com ele, vou poder assistir o que quiser, na hora em que eu quiser e as meninas vão poder se divertir.
Não pensou duas vezes. Tomou um banho gostoso. Colocou a melhor roupa.Passou um batom vermelho na boca e lá foi ela bater na porta da casa de Januário com o propósito de convidá-lo para tomar uma cerveja.
Januário assustou-se ao abrir a porta. Não podia acreditar naquela cena. Uma moça bonita, novinha e tantas vezes assediada por ele convidando-o para sair. O coração do pobre velho estava na boca. Então ele lhe disse::
- Pra sair com uma moça tão bonita eu preciso me arrumar.
Ao fechar a porta, mudou de idéia:
- Vamos ficar aqui mesmo. Aqui é melhor de conversar. Tem cerveja na geladeira e ninguém para atrapalhar.
A TV estava ligada. A sedução das imagens deixou mais claro o propósito de Leda e, sem titubear, Leda foi logo disparando no assunto:
- Januário! Quero me casar com você, mas tem uma condição. Eu quero uma TV para o nosso quarto e uma TV para o quarto das minhas filhas.
O peito de Januário parecida querer explodir. Podia ouvir a força das batidas de seu velho coração.Na altura dos seus setenta anos, ele não desperdiçaria, jamais, aquela oportunidade de se enroscar na pele macia e vibrante de juventude lhe ofertada, só por causa de duas TVs.
Naquele mesmo dia, Leda e as meninas se mudaram para a casa de Januário. Na semana seguinte, as TVs já estavam lá. Alguns meses depois, casaram-se de papel passado. Depois disso, mesmo na hora do vamos ver, naquela casa, não se desliga a TV.