Um raio de sol
Nem sempre temos noção do significado das pequenas coisas da vida. Atos, palavras, pensamentos que transformam o universo. Posturas ante situações que, se pensadas, refletem mais do que gostaríamos de mostrar de nós mesmos...
A reflexão que se faz ao caminhar pode ser considerada uma das melhores terapias, verdadeira meditação do dia-a-dia.
Ana passava pelas pessoas, pelos lugares, muitas vezes sem os notar, submersa em pensamentos. Mas havia uma pessoa, que ela sempre notava. Um velho, mendigo, sentado no chão, ao lado de sua cadeira de rodas. Tinha um olhar tranqüilo e um meio-riso constante, os quais tornavam seu semblante um tanto curioso.
Duas vezes por semana atravessava aquela praça e, ao passar pelo velhinho, sorria. Dava um daqueles seus sorrisos mais bonitos. E ia-se embora.
Podia chover, que lá estava ele, com a mesma expressão fagueira e amistosa. E, muitas vezes, Ana sentia-se mal por não ter nada a oferecer ao tão sofrido senhor.
Certa vez, estava muito apressada e, como um temporal se anunciava, decidiu correr até seu destino... porém, ao passar pela praça, notou a ausência de algo. Parou, olhou ao redor, e notou que aquele bondoso e necessitado senhor não estava ali.
Deu de ombros, “deve ter ido se esconder da chuva”, continuou sua corrida.
Passou-se uma semana e a ausência dele a inquietava. Após vários dias úmidos e frios, Ana avista-o de longe.
Desta vez, além do costumeiro sorriso Ana pergunta-lhe a razão do desaparecimento. Este a responde com outro sorriso e depois completa: “Estava muito adoentado. Pneumonia. Quase não agüentei desta vez. Mas eu tinha uma razão muito forte para melhorar e voltar para cá”.
“E qual seria uma razão muito forte para alguém desejar voltar para as ruas, para mendigar?!”, pensou Ana, atônita. E arriscou perguntar:
“E que razão foi essa?”
“Não poderia morrer sem nunca mais ver o teu sorriso”...
Os olhos de Ana encheram-se de lágrimas, e seu coração parecia que ia pular pela boca... “Como um estranho poderia dar tanto valor ao seu sorriso? Como um homem, aparentemente rude e ignorante, poderia ter tamanha sensibilidade?” Às vezes ela se achava meio boba, pois sorria para todos, inclusive desconhecidos... adorava sorrir para as crianças, pois estas, com a inclusão de alguns velhinhos, as únicas a rebaterem com outro.
Depois deste dia, Ana nunca mais o viu, mas a memória dele ainda vive em seu coração, principalmente por ter-lhe mostrado o valor de pequenos gestos, como o sorriso, que pode ser o único raio de sol na vida de um ser, que só quer ser humano...