A RAIVA
A RAIVA
Dircilene era uma jovem com alma de velha, bonita não era, mas também não era horrorosa; de todo modo ela não tinha motivos suficientes para se queixar tanto, porque ela se queixava da saúde, do dinheiro curto, dos pais, dos irmãos, dos parentes, da vida, do possível e do impossível, na verdade ela nem sabia porque se queixava tanto, era uma mania insuportável.
Os velhos se queixam por falta de opção, querem chamar a atenção das pessoas e as vezes até conseguem, mas de uma maneira negativa e destrutiva, porque são atendidos, mas sem nenhum lucro e destruindo a paciência das pessoas, tem a desculpa da velhice e usam e abusam dela, mas no caso de Dircelene nem essa desculpa ela tinha, porque era jovem demais.
Nas festas era deixada de lado, as moças corriam dela para escapar de sua prosa sinistra e os rapazes não dançavam com ela, porque até durante a dança ela se queixava de alguma coisa, nem que fosse dos sapatos apertados, mas ela não se emendava e continuava com sua mania; aos vinte anos, ela aparentava ter trinta porque não se cuidava, suas roupas eram fora de moda.
Seu corte de cabelo era uma coisa quadrada, não cuidava da pele, nem das unhas, maquiagem ela não usava, mas mesmo assim arranjou um namorado até bem bonitão, parecia um milagre e logo noivaram e o casamento foi marcado, era espanto sobre espanto para a comunidade de Santana Mestra, até o ultimo minuto todos esperavam que o rapaz desistisse daquela idéia.
O noivo que se chamava Deraldo das Graças Souza não desistiu e o casamento se realizou; no começo parecia que as coisas estavam bem, mas um ano depois ele se cansou de ouvir as lamurias da feiosa mulher e simplesmente anoiteceu e não amanheceu, sumiu no mundo, deixando para trás aquela criatura que se já era de mal com a vida, se tornou inimiga mortal dela.
Dircelene ficou com tanta raiva do abandono do marido, que além de não falar o nome dele, mudou a oração da Ave Maria, passou a rezar assim: Ave Maria, o senhor é convosco e seguia em frente, mas cheia de graça ela nunca mais disse, porque o marido fujão tinha Graças no nome e assim enraivecida, queixosa e infeliz ela viveu até aos noventa anos; quando ela se foi a cidade de Santana Mestra respirou aliviada.
Maria Aparecida Felicori{Vó Fia}
Texto registrado no EDA