Casal liberal que procura outros casais para aventurarem-se em novas emoções
- Será que é aqui?
- Veja o número.
- 43, rua dos Alexandrinos, edifício XV de novembro. É aqui mesmo. Vou tocar a campainha. Preparada? Arrume essa saia, penteie esse cabelo direito, passe um batom.
- E você nasça de novo. Cale a boca e toque logo.
“Blem dom”
Era uma mulher bonita, alta, loira, olhos azuis, sensual. Aurélio deu uma olhada que, se seus olhos tivessem boca teriam engolido ela.
- Sim? – disse a moça com um olhar desconfiado.
- Bom... é que...
- Nós viemos experimentar novas emoções – Rita completou tão baixo que a moça do apartamento teve que encostar os ouvidos na boca dela para entender.
Sem ter certeza do que estava fazendo, ela os convidou para entrar. Aurélio e Rita sentaram no sofá de dois lugares e a moça no de apenas um. Ficaram olhando um para o outro até que a dona da casa se levanta e vai a cozinha preparar-lhes um café. Rita olha para Aurélio. Ele estava observando a porta da cozinha.
- Acho que ela está com vergonha, Vui a maneira que olhou para as portas dos apartamentos vizinhos. Também, quem não teria vergonha de fazer uma coisa dessas. Deixar explicito o local, comprometendo até a família. Não é verdade? Aurélio, Aurélio, ô Aurélio dá para prestar atenção no que eu digo.
- Desculpe-me. Mas ela é realmente bonita, acho que vai valer a pena. Cadê o marido dela?
- Não sei, mas espero que seja um, tipo assim, bombeiro, fortão, que dance com os músculos. Sabe aquele movimento de sobe e desce que alguns musculosos sabem fazer com cada peito.
- É sei sim, mas acho que você também sabe o que algumas mulheres, que chamo de potrancas, tirando você, é claro, sabem fazer com uns belos peitões e um...
- Café? – a moça perguntou interrompendo a conversa do casal.
- Ah, sim obrigado – agradeceu Rita com um olhar soltando raios – Mas você nas horas vagas trabalha com o quê?
- Bom eu sou do lar.
- Ah sim, do lar, claro. Eu sou veterinária. Entendo muito de potrancas – disse Rita agora olhando Aurélio- E seu marido? Ele está por aí?
É claro que a moça estranhou a pergunta. O que ela queria com o marido?
- Ele logo chega. Foi comprar algumas coisas. Medidas de segurança – respondeu a moça com as mãos na barriga.
- É muito bom mesmo essas medidas. Melhor prevenir do que remediar.
De repente o silêncio tomou conta do negócio. A cabeça do Aurélio estava viajando nas possibilidades que poderiam surgir com a moça.
“Deve ser uma maravilha. A loira, e minha esposa. Essa nem tanto, mas aquela, nossa! Olha que coxas, que peitos, que boca. Agora, coitada da minha esposa. Que estrias, que gordura, que celulites. Mas, assim como eu, o maridão dela também deve estar enjoado e por isso deve ficar mais com a Rita. Onde será que vai ser? Na cama? No sofá ou na sala mesmo?”
- ...aí ele ficou com uma dor nos pulsos sabe. Não é Aurélio? Aurélio?
- Quê? Ham? Ah sim, que dor.
“Já viraram amigas. Isso não é muito bom, logo elas começam a trocar receitas e o objetivo vai embora. Vou atrapalhar, amizade nessas horas não vale”
- Será que vai demorar? Poderíamos começar né?
- Nada disso. Sem o bombeiro não começo.
- Que bombeiro? – disse a moça – começar o quê?
- Escuta aqui, não precisa mais ficar fingindo. Já estamos dentro da sua casa, ninguém vai ouvir.
- Ouvir o quê? – perguntou incrédula a dona da casa.
- Aurélio, seja menos grosseiro com a moça.
- É que eu gosto de um sexo violento.
- Sexo? Violento? Do que vocês estão falando?
- Oras, como assim? Vocês não são o “casal liberal que procuram outros casais para aventurarem-se em novas emoções”?
- Quê?
- Não se faça de boba. Estava no anúncio. Eu e a Rita precisamos de algo que acalore a nossa relação, ela não anda muito boa. Acho que o problema é a novela.
- Que novela Aurélio? Já conversamos sobre isso – trovejou a Rita – O problema é que estamos em um momento radical da relação. Eu não queria de jeito nenhum, mas pensei bastante e experimentar não custa nada.
- Escuta aqui vocês dois – disse a moça apontando para cada um – não sei quem são vocês, e muito menos o que querem. Mas levem tudo, mas não me matem. Não deveria ter deixado entrarem, mas eu tenho o coração bom, pensei que quisessem tomar alguma coisa, ou que fossem os vizinhos novos. Confesso que são meio estranhos, os vizinhos novos, mas uma amizade não custa nada. Meu marido está para chegar, por favor não façam nada para nós.
- Uma encenação faz parte do negócio. Policiais e ladrões. Disfarça também Rita.
- Eu acho que ela não está disfarçando. Mas em todos os casos.
Rita levantou-se e puxou Aurélio. Eles imitaram uma arma com as mãos e começaram a dizer, como se fosse um texto decorado:
- Nós viemos, roubar ...roubar. Roubar o que Aurélio?
Aurélio cochichou no ouvido de Rita. A moça não conseguiu entender o que ele disse.
- É isso aí, viemos roubar a sua... espera. Aurélio o que nós estamos fazendo? Eu não vou roubar isso de ninguém. Eu vim aqui para roubar a mangueira do bombeiro.
- Você não vai roubar nada Rita. Que mané mangueira de bombeiro.
O casal começou a discutir na frente da moça. Ela começou a acreditar que eles poderiam ter errado de casa e que não fossem realmente ladrões. De repente a campainha toca. A moça fica branca como leite, Rita e Aurélio se sentam. A porta se abre. Era o marido da moça.
- Esse é o bombeiro? – perguntou Rita
Um homem raquítico, baixinho, careca, com óculos fundo de garrafa olha para trás para ver se havia algum bombeiro.
- Vai lá Rita, aproveite e roube a mangueira dele – retribuiu Aurélio.
- Mas o que está acontecendo aqui? – perguntou o marido – Quem são vocês?
- Nós somos o “casal liberal que procuram outros casais para aventurarem-se em novas emoções”
- Quê?
- Depois eu lhe explico amor. Eles já estavam de saída. Obrigado por nos visitarem, voltem qualquer dia para conversamos melhor. Eu disse conversarmos, entenderam. E quem sabe eu faço profiteroles.
- Profiteroles? Você sabe fazer? – perguntou Rita
- É lógico. Vai me dizer que não sabe.
- Eu já tentei, mas nunca sai como os outros. O Aurélio que é a minha cobaia para experimentar.
- Mas é fácil, fácil fazer. É só colocar a água, a manteiga, o açúcar e o sal numa panela média, aí você leva ao fogo baixo...
- Você bebe cerveja? Perguntou o marido da moça
- Claro.
Os dois sentaram no sofá e ligaram a televisão.
-Mas, diga-me, como é ser bombeiro?