O carapicu
Assim que teve alta do hospital Alfredo estava decidido: largou o emprego. Precisava de um tempo para repensar a vida, a situação que o levou ao hospital já havia saído de seu controle há muito tempo. Até aquele momento tinha uma vida profissional muito bem sucedida, a custa de muito trabalho e muita ausência. O sucesso nos negócios tinha lhe proporcionado uma excelente posição social. Os bons contratos que conseguia com seu enorme talento para o business fazia dele um homem cercado por ternos italianos, sapatos alemães, gravatas francesas e carros japoneses. Mas Alfredo percebeu que como naquela velha canção que o pai cantava, tinha tido muitas coisas...menos a felicidade.
E era exatamente em seu pai que Alfredo pensava no instante em que saía do luxuoso hospital em que havia sido internado. A história se repetia, felizmente com final diferente. O mesmo stress que hoje lhe brindava com um princípio de infarte, havia levado alguns anos antes o seu pai.
Resolveu pegar a mulher e o filho, entrou no carro e partiu. Foi em direção à pequena cidade litorânea de Arraial do Cabo, local onde costumava passar as férias na infância, uma espécie de sucursal do Paraíso localizada a duas horas do Rio de Janeiro.
Ao chegar na entrada da cidade já podia ver aquela imensidão azul turquesa que era o mar, muito mais azul que em sua lembrança desbotada pelo tempo. Depois de instalar a família em uma pousada, correu em direção à praia e ficou algum tempo parado ali fitando o horizonte. Tinha a boca seca do sal e do sol, e a alma plena de céu e mar. Mergulhou e enquanto estava imerso naquele mar paradisíaco sentia-se criança novamente. As pequenas ondulações que lambiam seu rosto eram como beijos de seu velho pai. Podia sentir a presença dele.
Passou alguns dias ali, com a mulher, replanejando a vida. Voltaria a estudar, abriria uma nova empresa, não se preocupava muito com isso agora. Só queria reencontrar aquilo que o sucesso nos negócios o havia feito esquecer: a felicidade. Levou seu filho para pescar nas pedras assim como seu velho fazia com ele nas férias. Entre um arremesso e outro, sentiu a fisgada da felicidade que havia perdido e a encontrou na outra extremidade da vara de pesca, e no sorriso do seu filho ao ver o peixe que juntos acabavam de pescar. E lembrou que a felicidade é uma coisa simples, simples como um carapicu pendurado na ponta do anzol.