Conto Vespertino.
Ela tinha um olhar que se fixava tão suavemente em seu interlocutor, que chegava a causar inveja em quem percebesse isso... o andar era calmo, e provocador; parecia também estar pisando em nuvens, de tão leve que seus passos eram...
Os cabelos eram pretos e belos; nem tão longos, nem tão curtos. Devia ter um metro e uns setenta centímetros... os olhos eram cor de céu; e grandes. Pareciam burquinhas. A roupa era simples, mas muito bonita. O corpo tinha muitas curvas... lembro-me que ela passou perto de dois homens, que gritaram coisas que não posso citar aqui... mas alguns elogios também se fizeram presentes.
Ela não parecia estar percebendo tudo aquilo; acho que nem sequer tinha me visto. Parecia estar longe... longe dali, e de todas as pessoas deste mundo. Reparei melhor no olhar dela (que fitava o chão, caminhando pela calçada) e notei uma certa melancolia...
Ela parecia ser do tipo "sensível demais por dentro, mas parece ser durona por fora"... e era. Pude constatar ao ver que rapidamente ergueu sua cabeça, e num breve momento, olhou para o céu. Deu um lindo sorriso ao ver algumas crianças brincarem... e continuou caminhando.
Eu assistia a tudo isso de longe, mas conseguia ver nitidamente suas expressões.
Eis que ela foi chegando perto de onde eu estava; e ela, num ato muito rápido, passou por mim. Simplesmente passou. E falou um "oi" bem simpático. Respondi com um sorriso...
Foi sumindo no horizonte, a partir da cena descrita acima. E eu ainda a acompanhava com o olhar; ela me fez refletir tanto, me fez sentir tantas sensações em apenas alguns minutos, que acredito que jamais esquecerei do seu rosto.
Alguma coisa no semblante dela me parecia familiar; talvez fosse apenas os traços, um tanto perfeitos, ou até mesmo a melancolia no olhar... bem, não sei ao certo; só o que sei é que nunca mais a vi. Nunca mais ela passou pela rua, nunca mais.
Às vezes tenho impressão de que ela nunca existiu; sim! Devo tê-la criado em minha mente... ou então, talvez tenha morrido. Morrido? Ah... Deus do Céu! Acredito que não! Era tão jovem... parecia tão saudável... talvez ela estivesse nessa cidade só de passagem, ou fosse de outro país...
Bem, horas discuti comigo mesma sobre quem seria ela... e ali na calçada fiquei.
Só depois de muito pensar, vi que ela era eu...