UM PRESENTE ESPECIAL

Carol Gonzaga Coranza era madame com letras maiúsculas, mas reservada ao ponto de ninguém no edifício saber exatamente quem era. Diziam ser viúva de um cônsul, filha de um desembargador e até amante de um embaixador europeu.

De verdade mesmo só o nome.

Na noite de 24 de dezembro, quando o relógio marcou 24 horas, madame Carol repetiu o ritual de anos. Impecavelmente vestida com um longo vermelho sereia que definia suas curvas, brincos de stras e um anel de rubi que tão bem contrastava com as unhas também vermelhas e bem cuidadas. No cabelo um coque dando um toque de sensualidade; batom bem delineado naqueles lábios carnudos sem falar na flagrância natural que exalava de sua pele morena.

Sentou-se na frente da luxuosa penteadeira, olhou por longos segundos a embalagem luxuosa e perguntou-se: quem estaria presenteando-a desta vez? Qual seria o presente?

Com o cuidado de fazer inveja a uma mãe ao dar banho pela primeira vez no primogênito, a solitária mulher começou abrir a pequena caixa e seus olhos brilhavam de expectativa a cada movimento de seus pequenos dedos.

Era um frasco de apenas 60 ml do perfume Hagarasê de fabricação limitada a apenas 900 unidades anuais, e composto por mais de uma centena de secretíssimas essências.

Um líquido que valia uma fortuna e que muitas rainhas e princesas sequer ouviram falar.

Esse alguém conhecia alguns de seus segredos guardados a sete chaves, e o presente viera num momento oportuno.

Madame Carol abriu cuidadosamente o lacre e fechou os olhos. O aroma tomou conta do apartamento e as minúsculas partículas passearam lentamente até grudarem-se em cada centímetro quadrado daquele grande espaço. Carol sentiu-se flutuando diante desse êxtase. Segundos que pareciam infindáveis e que preenchiam de comoção sua solidão.

Ah, sim! Quem seria a pessoa que sabia tão bem seu fino gosto e a existência do Hagarasê?

No pequeno papel com letras que mais pareciam um desenho feito por mãos angelicais, um nome cheio de nobreza.

Madame Carol lacrou o pequeno frasco e deitou-se de costas na cama cheia de contentamento, fechou novamente os olhos e com respiração vagarosa absorveu todo o aroma impregnado naquele aposento. Não podia perder nada. O momento era de magia, gozo, poder.

Minutos depois adormeceu realizada. Entre os dedos da sua mão direita repousava o papel escrito: CAROL GONZAGA CORANZA.