***Alem do véu***III

*Crenças*

Ainda naquele dia pude conhecer melhor nossos hospedes, uma vez que fui encarregada de servir-lhes de guia e de cuidar para que nada lhes faltassem. De imediato gostei de Lisa, uma jovenzinha de doze anos, muito esperta para idade, alegre, carismática, enfim, encantadora. Já com a senhora que por Lisa, soube que se chamava Libéria não conversei, simplesmente porque esta se recusou a falar. Sumira a outra mulher, a de olhos negros é um tanto calada também, aliás, todas as mulheres de Rear devem ser, uma vez que mal lhes é permitido abrirem a boca.

Ajudei-as a se despir das suas longas roupas que não deixam amostra nenhuma parte do corpo, uma vez que até o rosto era escondido por um véu, em seguida lhes ofereci vestidos brancos e simples, porém confortáveis, Sumira ficou um tanto apreensiva com as novas vestes, Libéria não quis aceita-las, mas, Lisa ficou simplesmente maravilhada, rodopiava pelo quarto se olhando no espelho, para ela éra como se estivesse se libertando de algo que a prendia e sufocava.

Os dois criados preferiram ficar juntos aos nossos, por mais que eu tenha insistido para que permanecessem com os demais na casa de hospedes. Já o rapaz que se chama Amir, o achei um tanto recatado, mas, muito carismático e dono de um bom coração, apesar de ser de Rear. Quanto a Abner, bem... Esse não vale a pena nem falar.

Neste momento estou na sacada sul, o meu lugar favorito, ponderando em como coisas antes simplesmente inimagináveis de uma hora para outra passa a acontecer, como certos sentimentos que sequer se esperava sentir, de repente se fazem presente.

Eu, uma sacerdotisa de Breed, apaixonada? Ainda mais por um homem de Rear, por Ci a grande mãe, Hainan onde está com a cabeça? Perguntei-me. Faz três meses que ele está aqui, apenas três meses e deixei me envolver assim, Amir, saboreio o seu nome, como um doce que me é proibido, tão gentil, tão simples.

Tão perdida estou com meus pensamentos que não percebo Lisa se aproximar.

---Oi!

---Oi Lisa! Que susto, estava tão distraída.

---Percebi, Disse ela cheia de sorrisos. Você gosta de ficar aqui em cima não é?

---Gosto sim, aqui é tão alto que me sinto mais perto do céu.

---Sabia que no meu país não se pode construir uma casa em cima da outra, como esta daqui?

---Não?! Mas por quê?

---É tido como uma afronta ao grande Dior, só não me pergunte o por que.

Não perguntei, apenas olhei para longe, lá para outra margem do rio, onde moravam os poucos homens e suas mulheres que abnegaram do conforto, da segurança de morar no vale, para ficarem com eles, então me perguntei, será que eu faria o mesmo?

---Hainan?

---Sim?

---Eu estava lhe perguntando sobre Breed.

---Desculpe, hoje estou mesmo distraída, o que quer saber sobre Breed?

---Não sei exatamente, hã... como ela é?

---Há, eu não saberia te dizer exatamente como uma deusa é, eu sei te dizer o que ela nos representa.

---E o que ela representa para vocês?

---Breed, ou Brida em outras línguas representa todas as artes femininas, ela esta relacionada à agricultura, à inspiração, à aprendizagem, à adivinhação e profecia, à bruxaria e ao conhecimento do oculto e também ao amor, é a deusa da fertilidade e também do fogo.

---Nossa! Tudo isso?

---Tudo isso. Assenti.

---E...

---Pode perguntar. Incentivei-a ao perceber sua hesitação.

---Porque você tem uma lua tatuada na mão direita? É... bem, é que a Sumira me falou que isso é um símbolo ruim.

Antes que eu falasse qualquer coisa ela acrescentou. –Mas, eu gosto da lua, portanto não acho que seja ruim.

---Claro que não é ruim, a Sumira acha que é, simplesmente porque ela não sabe a verdade.

---E você vai me contar? Perguntou cheia de excitação.

---Não sei se devo... Brinquei.

---Ah! Por favor, me conta vai, eu prometo guardar segredo.

---Está certo, nós sacerdotisas usamos a lua como um símbolo, e este símbolo representa muita coisa, mas principalmente os princípios femininos e o lado oculto da natureza, ela também representa à intuição, à emoção, à inspiração, à imaginação, e outras coisas.

---Que outras coisas?

--- Não senhora, já falei demais mocinha, daqui a pouco você resolve entrar para nossa irmandade.

---Bem que gostaria.

---Lisa, não diga uma coisa dessas, você tem os seus costumes, a sua tradição.

---Não dou a mínima para eles, você vai ver, um dia ainda venho morar aqui.

Eu ia rebater essas idéias, quando Amir apareceu, me fazendo parar de chofre.

---Ah! Lisa então você está ai, estava procurando-a, sabe é que está na hora de banhar-se.

---Não está não.

---Está sim, é melhor descer logo, ou Libéria vai se zangar.

Lisa desceu reclamando, olhei para Amir e percebi que ele havia mentido, que na verdade era apenas uma desculpa para ficarmos a sós.

Como um simples olhar pode agir assim, como uma corrente elétrica percorrendo todo o meu corpo? Desviei o olhar para tentar amenizar essa reação.

---Essa garota vai dar trabalho. Disse a primeira coisa que me veio à mente, só para disfarçar.

---Vai, vai sim, pobre menina. Ele disse isso de forma tão sentida que me comoveu.

---Acho muita responsabilidade para ela, ter de ser mãe de um escolhido.

---Também acho.

---Acha mesmo Amir, quer dizer, são suas tradições, não são?

---Sim, mas eu não concordo com todas elas.

--- Fala sério mesmo? Ou os três meses que passou aqui foram o suficiente para fazer você mudar de opiniões. Disse sarcasticamente.

---Falo sério sim, e não tem haver com o tempo em que estou aqui, afinal, vocês também tem costumes com o qual não concordo.

---Ah! É mesmo, quais?

---Ah! Deixa isso pra lá.

---Não mesmo, quero saber Amir. Disse imitando um tom de falsa acusação.

---O fato de vocês não se casarem.

---Isso!?

---Não é pelo casamento em si, é pelas diferenças entre iguais, não concordo com o feminismo de vocês, assim como não concordo com o machismo do meu povo, uma vez que acredito que todos são iguais. Não acredita nisso Hainan?

É a primeira vez que ele pronuncia meu nome, até então sempre me tratou com o respeito que se dirige a uma sacerdotisa, e ao ouvir dize-lo assim de forma tão espontânea me fez estremecer e sentir algo que ainda não sei bem explicar, algo tão sutil, tão bom.

---Acredito sim, Respondi baixinho.

Ele sorriu pra mim, um sorriso tão doce.

---Será que existe um lugar assim Amir, um lugar onde não importa se é homem ou mulher, se é rico ou pobre, onde todos sejam iguais?

---Não sei Hainan, não sei.

sutini
Enviado por sutini em 21/01/2009
Reeditado em 25/01/2009
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