Só pra lembrar outra vez...
O dia amanheceu sereno. Nuvens dispersas não encobrem o sol radiante, e o murmurinho vindo da rua confunde-se com o canto dos pássaros. Levanta-se e caminha pelo pequeno corredor em direçao ao banheiro. Escova os dentes, penteia os cabelos e prende-os num rabo de cavalo. A cozinha fica no fundo do quintal, e o cheiro de café a atrai... Caminha pesadamente, sentindo sobre si o peso da responsabilidade, o peso das atitudes... Não, amadurecer não seria a palavra apropriada... Envelhecer.... sim, envelhecer... todos os seus dias chegaram num ímpeto, num único dia... Em apenas vinte e quatro horas sentiu todo o peso de uma existência. Refaz a xícara de café; gosta do sabor forte, meio amargo. Consegue privar-se de várias coisas, mas do café não... tornara-se um vício, um saboroso vício!
A cabeça está atormentada, são milhões de pensamentos que surgem como flashs, às vezes coerentes... outras, totalmente confusos.
Sente necessidade de estar só. Quer sair daquele lugar o mais rápido possível, como se fosse possível apagar das lembranças o que tanto a machuca, fere, angustia... São muitas as lembranças... muitas. Talvez fugindo consiga libertar-se...
Tola! Como se fosse possível fugir de si mesma. Como se pudesse deixar para trás o que está entranhado, fundido em seu ser.
Olha para o relógio. Combinaram de sair às 10 h.
Confere mais uma vez a bagagem e sai. Faz apenas um leve aceno para todos... não gosta de despedidas...
Senta-se e observa o motor sendo ligado. Pelo vidro observa o vai e vem das pessoas. Estampas coloridas, riso solto, crianças correndo...
Olha para trás ainda uma vez... Sente um aperto no peito. Respira fundo... uma, duas, tres vezes.
- Pode repetir o que disse? desculpe-me, eu não estava prestando atenção.
- Sim, realmente... o dia promete muito calor.