Sementes...
A estrada de terra parecia imersa em uma neblina vermelha em pleno meio-dia, o sol também vermelho queimava as costas nuas de Antenor que caminhava apressado rumo ao seu rancho que ainda distava meia légua... Se possível fosse olhar de cima se veria um rio vermelho cortando a selva verde musgo... O rio que outrora brilhava como um grosso fio de prata hoje está cheio de ossadas de animais sedentos que vieram de longe para matar a sede e mataram-se a si mesmos pelo esforço da caminhada em vão...
Antenor volta pensando que a lagoa perto de seu rancho, agora mínima, sobreviverá no máximo por cinqüenta dias e o saco de sementes que leva consigo terá no máximo esses dias de água rala e terão que resistir e germinar senão a fome será eterna por mais um ano...
Após caminhar por dez minutos numa picada mata adentro, Antenor avista o rancho, mas assusta-se por ver-lhe a porta derribada e nesse ínterim um macaco bugio guincha alertando o grupo invasor que foge carregando a miséria toda de Antenor... Toda sua comida, suas últimas reservas que seriam racionadas por dois meses... O prejuízo foi total, até sua louça de barro feita por índios está toda quebrada...
Só resta de alimento para Antenor o que está contido no futuro das sementes que carrega consigo...
Meses se passaram e Antenor entra na Capela que acabou de fazer com madeira nativa e coloca flores e uma espiga de milho no altar vazio... Fecha os olhos e ora em voz baixa:
- Senhor, obrigado por há meses atrás teres me dado as sementes de que necessitava, inclusive a da fé... Obrigado, Senhor, por ter eu conhecido a fome que me deu a humildade e a sabedoria porque das sementes que me deste, metade eu plantei, uma outra parte eu usei como isca no meu único anzol para pescar os últimos peixes das águas da tua lagoa, outra parte usei para caçar as aves do teu céu... Agora lhe peço forças para começar a colher o que a tua terra me deste, mas Senhor... Peço-te mesmo é mais sabedoria para dividir esse alimento que excederá minhas necessidades e dele faça eu divisão com meus semelhantes pobres, porque Senhor, abençoaste-me com dádivas do céu, da terra e das águas, permiti-me agora iniciar merecer viver na Tua luz, próximo a Ti em Teu reino quando Tu me levar na morte de meu corpo físico... Assim seja...