A DECISÃO DE FUTRICA, A CADELA RELÓGIO

(Hull de La Fuente)

 


Cap. II



_Ajudem-me!

_Não deixem “seu” Ezequiel me levar.

_ Por favor, eu amo vocês!

Por mais que protestasse com seus latidos, com tristeza, ela viu o ar de alívio estampado nos rostos dos membros de “sua” família, quando seu Ezequiel a pegou.

 Nos últimos tempos as coisas haviam piorado na casa, muitas vezes ela ouvira seu Joaquim, o chefe da casa, dizer que ela, Futrica, era mais uma boca pra dar de comer.

Como num filme, Futrica recordou os momentos de felicidade vividos com a gente daquela casa. Como tinha sido bom o dia em que Dona Eunice, mulher de seu Joaquim, ganhara um monte de ossos ainda com alguma carne. Dona Eunice fez um cozidão com inhame e verduras. Tonico, o mais velho dos meninos, deu-lhe alguns ossos bons de roer.

Também teve os dias em que nas fazendas próximas, bois foram abatidos, naquelas ocasiões seu Joaquim levou pra casa, pedaços de vísceras dos animais e por alguns dias, todos comeram pirão com sarapatel.

Ela não censurava seu Joaquim nem dona Eunice por dá-la de volta ao fazendeiro.

Todos na casa eram tão magros, inclusive ela, Futrica. Fazer o quê? 

Mas seu coração estava doendo, sua família não podia mais ficar com ela.

Ninguém chorou quando seu Ezequiel a pegou, mas bem que Tonico virara o rosto e olhara pra parede de barro batido. Ele era seu amigo, era ele quem a levava ao riacho pra lavá-la, que catava suas pulgas, afagava suas orelhas. Um dia a levou pra caçar pombas no mato. O Tonico era tão magro quanto ela, podia-se contar suas costelas. Como era boa a companhia de Tonico.

A camionete parou no pátio da casa da Fazenda. Ezequiel olhou para Futrica com ar de pena. Em seguida ele a levou pra dentro da casa. Tudo lá era grande, diferente, cheio de lugares bons pra deitar e tirar um cochilo, mas certamente o velho cachorrão que vira ao chegar, não deixaria. Depois, aqueles móveis, deviam ser os tais sofás que dona Eunice dizia que “era bom de se assentar”.

Tímida Futrica tremia assustada com tudo que via ao seu redor. 

Tentando acalmá-la, Ezequiel foi pessoalmente à cozinha e preparou um prato farto pra ela. Mas como comer se havia um nó apertando sua garganta?

Os outros moradores da casa também foram gentis com ela, mas eles não eram de sua família. Até o cheiro deles não era nada parecido com o cheiro da sua gente. Nada ali tinha importância pra ela.

Continua...

Hull de La Fuente
Enviado por Hull de La Fuente em 04/10/2008
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