VÍRGULA 2 : CONFIRMANDO A VÍRGULA (COR)

(CORRIGIDO)

CONFIRMANDO A VÍRGULA

VÍRGULA 2

Um dia desses, Gema da Lima, filha primogênita de um casal interiorano, fora expulsa do colégio, ou melhor do Grupo Escolar , porque flagraram-na colando , justamente numa prova de Historia do Brasil , matéria onde a decoração é ponto primordial .

Dona Das Dores, sua mãe, também professora da escola é chamada com urgência em sua casa pela Diretora , afim de se inteirar de fato abominável, naquele Anicuns distante, perdido entre córregos, morros e serras , nos recônditos p`ra lá de onde o Judas perdeu as botas. Ao chegar morta de vergonha, pois fato horrendo como este, já havia caído no domínio das fofoqueiras de plantão. Por todas as janelas e portas que passara, observou que os olhares maledicentes atingiam-lhe em cheio; o espaço de três quarteirões de sua casa até a escola pareciam uma eternidade. A comitiva era composta das outras filhas, como também de seu fiel marido. Ao adentrar pelo corredor que dava acesso a quatro salas de cada lado, ficando a diretoria na última sala, parecia que dantes tão largo corredor se estreitara tanto, dando-lhe a impressão que ela ali não caberia. Pensava que quando regressasse, o serviço de alto-falante estaria anunciando o fato lamentável, pois era justamente ali que todas as notícias boas ou más, principalmente as más, eram canalizados para informar toda a coletividade. Após eternos e longos minutos, adentra a sala onde era esperada, estando presente toda cúpula administrativa, já com o relatório feito e o termo de expulsão lavrado. Não titubeou, assinou o que era lhe era encaminhado e saiu rápido como entrara, chorando a cântaros.

Ali mesmo, tomara ela uma decisão depois de ser humilhada pela direção do colégio e todo seu corpo docente, arquitetava um plano diabólico, quando escutou a comadre Elza a diretora , concluir :

- Para o bem da cidade e que tal ato de indisciplina não sirva de mau exemplo, expulsamos a sua filha em nomes dos bons princípios e honestidade de nossa terra, e que nenhuma outra pessoa venha fazer, digo, venha a repetir ato tão indigno.

Mesmo antes de ouvir o termino do discurso, afasta-se rápida, enfrentando uma vez mais, a maldade daquela gente, rindo, gozando, do ato criminoso que a sua filha havia acabado de cometer, de acordo com o estágio cultural dos aldeões.

- Miseráveis todos vão me pagar, resmungava baixinho.

O caminho de retorno se fazia longínquo, até parece que os quarteirões estavam mais distantes, ela implorava aos céus , religiosa que era , que lhe aparecessem agora todos os atalhos do mundo . Mas nada sob o sol a pino, via-se obrigada a percorrer todo o caminho, carregando a sua vergonha. As filhas que a acompanhavam faziam-no em absoluto silencio. Avistava-se já a sua casa, branquinha, alvura conseguida pela cal, comumente usado no meado do século XX, por aquelas paragens; os portais pintados a tinta a óleo, num tom grená, bem puxado para a cor da goiabada caseira, que ela tão bem sabia fazer, as portas de tábuas maciças com nós aqui e acolá, também tinham a mesma cor.

Na porta o seu marido, Sr. Onofre José de Lima, aguardava-as tranqüilo, com semblante justamente ao contrário de sua esposa . Branco cabelo ralos e claros prenunciando uma futura calvície, exercendo as profissões de sapateiro, ferrador de cavalo e nas horas que se fizesse necessário Juiz de Paz. Bigode ralo sob uma tez pigmentada, voz forte e decisiva.

- Onofre, veja só expulsaram a nossa menina do colégio. Volta lá e toma satisfação com a comadre Elza. Ela não podia fazer isso, pois sabe que ela é muito estudiosa. Sabe todos os pontos da História do Brasil de cor e salteado. É injustiça, vai lá e briga , xinga se for preciso . Não pode ser, ela sabia tudo, tomei os pontos dela ontem mesmo. Não aceito, é pura inveja, todo mundo tem inveja dela porque ela é bonita e inteligente, desde que ela fez aquele discurso para o Governador Dr.Juca Ludovico, que o pessoal daqui está tiririca com ela, bastou a Sua Excelência prometer uma bolsa de estudos lá na capital, principalmente o povo da UDN ficou todo mundo com inveja . Vai lá Onofre, colar ela não colou sabia tudo, se fosse a Das Graças , sei não pois ela é meio burrica .Põe para quebrar, não pode ficar assim. Vai homem, desembucha.

Saiu cabisbaixo, pensativo tentando encontrar solução para este caso, um entre os muitos que lhe apareciam, principalmente após o casamento. Além do mais mulher nervosa, ciumenta, nem pensar como era, tinha ciúmes da própria sombra, se ela soubesse que eu tinha que passar pela porta da casa da Rosângela, "ti vira p`ra lá pensamento" , aquela mulher é um morenaço , até mula-sem-cabeça a perderia de novo só de vê-la ; bem como eu já vinha concatenando , a Das Dores tem boas qualidades , professora leiga mas das boas , honesta até demais , trabalhadeira , domina a cozinha com maestria , os seus empadões , nem pensar gostosíssimos, Virgem nossa que gostosura e o arroz com pequi e pimenta bode , nossa estou morrendo de fome meu Deus preciso andar depressa com isso , a fim de jantar . Chegando no Grupo Escolar já no final do dia já não encontra mais ninguém, todos tinha ido embora aproveitando o restante do dia em afazeres diversos, após jornada de trabalho, naquela tarde morna e pachorrenta. Voltou para casa encontrando a mulher ainda mais apoquentada.

- "Mé" que é Onofre foi lá.

- Fui e não fui, (esta era uma de suas marcas registradas, rigoroso, autoritário e em alguns momentos intrigante e recheado de toques de suspense.)

- Fala homem o que resolveu?

- Nada e tudo, continuando nos seus jogos de palavras.

- Como assim?

- Nada porque já não tinha mais ninguém lá .

- Que é isso? Você não disse tudo.

- Sim mulher , tudo porque estive pensando bem , acho melhor deixarmos tudo do jeito que está , pois não existe nada mais certo que um dia atrás do outro ...

- De jeito nenhum, resmungou a mulher, vai lá na casa dela e resolve isso já já .

- Como? Atrapalhar a comadre no seu repouso?

- Isso mesmo, quem mandou ela bancar a atrevida. Vai homem, deixa de ser frouxo.

Goiânia, 28 setembro de 2008.

jurinha caldas
Enviado por jurinha caldas em 01/10/2008
Reeditado em 10/10/2008
Código do texto: T1205338
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