ERA UM MENINO

ERA UM MENINO

Por ser um povoado pequeno onde viviam pouco mais de oitocentas pessoas, tudo que existia era em um ou em uma: um medico, um ferreiro, um dentista, uma igreja e também um grupo escolar; tudo mais era na mesma contagem de um ou de uma e era mais que suficiente para as modestas necessidades do lugar.

O que havia de sobra era o jeito puritano de viver, namoros só sob os olhares vigilantes das severas mães de família, as moças eram vigiadas o tempo todo não só por suas famílias, mas também por parentes, amigos e vizinhos e isso garantia o bom comportamento de todas e de todos.

Na Vila de Santa Rosa os homens trabalhavam nos campos e em outros afazeres, mas as senhoras e jovens solteiras aprendiam prendas domesticas e cuidavam de suas casas, mas a única escola do lugar precisava de uma moça e de um rapaz para serventes, porque meninas e meninos estudavam em salas separadas.

Foi uma dificuldade se conseguir uma moça para o cargo de servente das meninas, mas dona Quitéria era viúva e sua filha mais velha Deusolina precisava trabalhar para ajuda-la no sustento dos quatro irmãos, só por isso ela consentiu na saída diária da filha para cuidar das meninas do grupo escolar.

O rapaz escolhido foi o Domicio e ficou tudo resolvido, os dois trabalhavam em dois turnos, um de manhã e outro a tarde e corria tudo bem até que os dois começaram a namorar, dos olhares passaram as conversas e ninguém percebeu nada, até elogiavam a seriedade da jovem Deusolina.

Havia um porão no prédio da escola e era lá que o casal de serventes se encontrava as escondidas para namorar; passa um dia, passa outro e alguns meses se passaram e Deusolina que era muito magra começou a engordar, e todos diziam:Olha só como a merenda do grupo está fazendo bem a Deusolina.

O tempo passando e a moça cada vez mais gordinha, mas como antes ela era magérrima ninguém desconfiou de nada, também quem se atreveria a pensar mal de uma jovem virgem e arrimo de família, mas certa noite ela acordou sentindo dores que ficavam cada vez mais fortes e sua mãe chamou o doutor Armando.

O medico chegou, examinou a criatura e ficou em apuros para dizer o diagnostico, mas dona Quitéria disse:pode falar doutor é muito grave? Ele respondeu: grave não é, ela está com dores de parto e a criança está chegando agora mesmo; foi um susto e a mãe disse que não era possível porque sua filha não era casada.

O doutor perdeu a paciência e disse que casada ou não era parto sim e para confirmar o parecer do medico a criança nasceu, era um menino bonito, saudável e com ótimos pulmões pois gritava a mais não poder; antes do dia amanhecer a noticia já se espalhara e o escândalo era enorme.

Todos queriam saber quem era o pai do recém chegado, mas estava difícil porque oficialmente Deusolina não tinha namorado; dona Quitéria muito humilhada e zangada com o acontecido, agarrou a parturiente pelo pescoço e exigiu a verdade, a moça contou que o pai era o Domicio, seu colega de trabalho.

A velha senhora foi direto a delegacia e acompanhada pelo delegado saiu a procura do artista, ele estava escondido debaixo da cama de onde foi arrastado pela autoridade; levado a casa de Deusolina foi casado a força pelo escrivão de paz que lá estava esperando, mas a encrenca estava só no começo.

O povo da austera vila não gostou da novidade, era a primeira vez que um fato como aquele acontecia no lugar e as famílias exigiam a expulsão do agora casal de seus empregos no grupo escolar, mas dona Quitéria pediu as pessoas que perdoassem, porque ela não poderia alimentar todos sozinha.

A senhora tanto pediu que resolveram perdoar e deixaram os dois com seus empregos, mas Deusolina vivia grávida ou de licença porque tinha um filho atrás do outro; em poucos anos tinham uma família enorme, mas de um jeito ou de outro conseguiram cria-los com seus pequenos salários e o povo se esqueceu do começo errado do casal.

Maria Aparecida Felicori{vó Fia}

Texto registrado no EDA

Vó Fia
Enviado por Vó Fia em 25/09/2008
Código do texto: T1196881
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