O DEFUNTO QUE QUERIA ANDAR

O DEFUNTO QUE QUERIA ANDAR

Jacó Barbicha era um preto velho, que causava medo não só as crianças como também aos adultos, pois se acreditava que ele virava lobisomem nas noites escuras da quaresma, cada habitante da Vila de São João tinha um bom caso para contar a respeito do assunto.

Alguém viu em certa Sexta Feira da Paixão o Barbicha no galinheiro do doutor Amâncio, meio homem e meio bicho rosnando e investindo nas galinhas, outro o encontrou num trote curto, em uma noite de lua uivando e babando que causava horror.

Era um pavor continuo de anos e anos, que se acabou em uma noite, quando o preto velho morreu só em sua velha cabana; claro que ninguém queria participar de tal velório, mas naqueles tempos não se usava deixar defunto sozinho e o jeito foi o delegado Zurico mandar um soldado montar guarda ao mal afamado falecido.

Vendo o praça de fuzil no ombro em frente a cabana, algumas pessoas se animaram e foram para lá armadas de varias garrafas de Zueira, a afamada cachaça da região; a noite ia alta, os galos já cantavam e o velório corria animado com boas anedotas e melhores risadas, porque o morto não era considerado merecedor de choro.

Quando senão quando, um dos pândegos deu o alarme: o defunto estava se mexendo, queria se levantar, foi um salve-se quem puder, o soldado no primeiro momento de pânico correu também, mas se lembrou que entre o delegado e o defunto era mais fácil enfrentar o segundo, voltou cauteloso e ficou só olhando.

De fato, o lençol que cobria o Barbicha estava se mexendo, subia e descia como se o morto respirasse fundo; o soldado achou melhor mandar chamar o cabo para resolver o assunto, o cabo chegou e foi informado do que acontecia e achou que aquele caso cabia a seu superior, que no momento era o delegado Zurico.

O delegado chegou chamado as pressas e foi logo perguntando se já tinham descoberto o corpo, mas ninguém chegara a tanto, o delegado ficou olhando e de fato o corpo parecia se mexer, por duas vezes o Barbicha se contorceu debaixo do lençol e os curiosos reanimados com a confortadora presença de Zurico se aproximaram.

E todos ficaram esperando para ver o que faria o defunto em seguida; o delegado foi se chegando e quando o travesso falecido se aquietou, de um só golpe puxou o lençol e caiu na risada para desapontamento geral, mas logo tudo ficou explicado: era um rato, grande como um gambá que fazia seu passeio noturno sobre o pouco apreciado defunto.

O caso correu de boca em boca e cada vez o rato do Barbicha crescia mais.

Maria Aparecida Felicori{Vó Fia}

Texto registrado no EDA

Vó Fia
Enviado por Vó Fia em 11/09/2008
Código do texto: T1173439
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