FESTA NO MORRO DO CHAPEU
FESTA NO MORRO DO CHAPEU
As festas na Fazenda do Morro Do Chapéu, eram afamadas em toda aquela região das barrancas do Rio Grande, as pessoas até rezavam para seus santos de devoção para garantirem seus convites, ninguém queria ficar de fora dos bem falados eventos; qualquer coisa era motivo para Seu Leopoldo dono da fazenda dar uma festa, se por coisa de pouca importância era aquela beleza, imagine agora que a filha única do rico fazendeiro ia se casar, a festa seria de arromba com toda certeza.
Quando a noticia se espalhou ninguém falava em outro assunto, e os preparativos para a ocasião era de espantar: quatro touros jovens foram abatidos, trezentos frangos, cento e cinqüenta leitões, cinqüenta perus, quilos e mais quilos de lombos, lingüiças e pernis, cestos enormes de batatas inglesas e doce, mangaritos, milho verde aos montes, abóboras, tomates, farinhas de todos os tipos e dúzias e mais dúzias de ovos, queijos de vários tipos, frutas de todas as qualidades e leite e manteiga a vontade.
E para acompanhar tudo isso, bebidas para todos os gostos a partir do aristocrático champanhe até a plebéia cachaça, havia de tudo e com a maior fartura; dona Etelvina a fazendeira e mais de vinte cozinheiras e ajudantes, levaram um mês para preparar os doces, primeiro cuidaram das frutas cristalizadas e depois prepararam cajus de coco, de amendoim, de leite, olho de sogra, quindins, balas de vários sabores e latas e mais latas cheias de doces de frutas variadas em calda.
Na véspera do grande dia, as cozinheiras e doceiras finalizaram o preparo dos doces com vários cremes, pudins, arroz doce, doce de leite cremoso, cocadas e muito mais; cozinheiros famosos foram contratados nas cidades vizinhas, para se encarregarem de todos os pratos do jantar, seria a maior festa de casamento jamais vista por aqueles lados, e ninguém queria perder a oportunidade de tirar a barriga da miséria, e como toda a região fora convidada ninguém iria faltar.
O doutor Anísio era o delegado da pequena cidade de Cruz Torta, e com sua esposa dona Eunice se preparou para viajar até o Morro do Chapéu para assistir ao comentado casamento, a viajem seria feita a cavalo e as senhoras montariam assentadas com suas saias longas, em um arreio que se chamava silhão era um jeito desconfortável de viajar, mas senhoras distintas nunca montariam como homens.
As quatro horas da madrugada, o doutor Anísio, dona Eunice e Dondinha a criada da senhora, partiram ainda com o escuro para a difícil viagem de seis horas no lombo dos cavalos, na metade do caminho fariam uma parada de uma hora para descansar e comer uma merenda na beira do córrego dos Patos, e ainda chegariam com tempo para o almoço e um bom descanso, antes da cerimônia que seria realizada a tardinha, e para a festa que atravessaria a noite.
Antes da partida dona Eunice perguntou a Dondinha se ela estava composta, quero dizer: se ela vestira suas calçolas, e a gorda crioula respondeu que sim e partiram, mas quando estavam chegando a fazenda que já estava cheia de convidados, o cavalo que Dondinha montava se assustou com alguma coisa e refugou, a coitada escapou do tal silhão e teria caído feio, mas foi salva pela grossa saia de gorgurão, que se agarrou no gancho do tal arreio e ficou dependurada.
Foi um susto geral, as pessoas correram para socorrer Dondinha, mas quando chegavam perto caiam na risada, pois a infeliz estava sem nada por baixo da saia e naquela altura e com toda aquela gordura, ela era um espetáculo ridículo, por fim desceram a criatura e dona Eunice foi as contas com ela dizendo: Dondinha eu perguntei se você estava composta e você disse que estava, e agora me faz passar essa vergonha.
A crioula respondeu: liga não patroa, a senhora se esqueceu que eu sou preta? Ninguém viu nada, tava tudo escuro, dona Eunice achou melhor se calar diante daquele argumento imbatível; passado aquele transtorno a festa continuou dia a fora na maior alegria, e quando a noite chegou o baile começou, e todos se divertiam dançado e aproveitando a ótima musica da orquestra contratada na cidade grande, e claro a comida, doces e bebidas foram servidas noite a fora.
Quando chegou a meia noite a orquestra executou a Valsa do Imperador, que os noivos dançaram romanticamente, e chegou a esperada hora de cortar o maravilhoso bolo da noiva, tudo corria bem até Dondinha se desequilibrar e quase cair em cima do enorme bolo, foi segura a tempo pelo zangado doutor Anísio e levou outra bronca de dona Eunice, parecia que a avantajada serviçal queria aparecer mais que a noiva.
Restaurada a ordem o baile continuou até o dia amanhecer, era realmente a melhor festa realizada no Morro do Chapéu, as coisas se acalmaram e para encerrar os festejos a noiva anunciou que ia jogar o buquê, foi aquela correria porque reza a tradição que a moça que pegar o buquê, será a primeira a se casar; e casar sempre foi o sonho de toda mulher seja ela jovem ou já passada da idade, e Dondinha já passada dos quarenta queria aquele buquê de qualquer jeito.
A noiva se posicionou em frente ao bolo que estava quase inteiro, se virou de costas para o mulherio e contou: é um,,,é dois...é três e jogou o buquê que subiu no ar, e antes que ele começasse a cair Dondinha correu como uma doida a seu encontro, mas perdeu o equilíbrio e empurrou a noiva que caiu de cara, corpo e alma em cima do bolo se sujando toda; no meio da confusão dona Eunice agarrou Dondinha e lhe deu uns bons tapas, mas ela não se importou porque conseguira pegar o desejado buquê, e assim terminou a maior festa da Fazenda do Morro do Chapéu.
Maria Aparecida Felicori{Vó Fia}
Texto reegistrado no EdA