Amor visual...
Aqui estou eu!
Sentado desconfortavelmente diante da televisão ligada.
Aí está você!
Sua expressão talentosa é tão repleta de talento. Você, naturalmente, é a expressão. As palavras saem de sua boca mostrando exatamente o que quer dizer. Seus olhos claros brilham quando transmitem as suas sensações. É um poder sem limites. Uma brasa eternamente acesa, que aquece e impulsiona as suas realizações.
Aí está você!
Mostrando a todos, mesmo com a sua voz modesta pronunciando modestamente o significado do sucesso. Seu jeito meigo e doce de colocar as suas opiniões, e embora afirme que tenha uma personalidade impositora, a coloca no mundo encantado das deusas.
Aqui estou eu!
Sem expressão alguma e tão longe do calor de seu corpo. Sinto que me é impossível chegar próximo a você. Existe uma distância muito grande entre os meus desejos ardorosos e àquela a quem este amante tão devoto confere todos os seus dias.
Aqui estou eu!
Busco rabiscar uns versos sobre esta minha devoção. Um poeta se arriscaria a tal poesia, pois a musa está logo ali, e, estes incansáveis redatores dos sentimentos humanos sempre estão dispostos a sofrerem com cada letra colocada nos papéis em branco.
Aqui estou eu!
Não sei se seria capaz de sofrer por tais versos. Não sei se seria capaz de sofrer por tamanha devoção. Não sei se seria capaz de rabiscar estes versos, embora confesse que durante anos tentei fazê-los e não consegui, sobretudo por não possuir talento algum.
Aí está você!
Pronunciando os seus projetos e as suas idéias a respeito de seu próximo filme. É tão simples a sua explanação.
Aqui estou eu!
Prisioneiro e fiel a este amor. Minha postura diante de sua imagem é o retrato fiel da minha submissão. Não escondo dos objetos da minha morada o calor que se passa quando assisto às suas entrevistas.
Oh! Minha querida e estimada xícara
Penso que a sua compreensão deste assunto é de suma importância para este amante solitário. Não me importo com os acontecimentos do mundo lá fora. É tão banal e sem sentido a vida dos humanos, que os desprezo. Os seus ouvidos, minha doce e atenciosa amiga, são para mim o mais confortante dos confessionários. Posso transmitir-lhe todos os meus mais íntimos desejos e sei que não me reprovaria de maneira alguma. É tolice imaginar que mais alguém poderia me ouvir com tanta atenção e discrição. Jamais um ser, supostamente vivo, me entenderia como você me entende.
Oh! Minha querida e estimada xícara
Sinto-me confortavelmente tranqüilo diante de você. O meu amor por esta imagem é bem maior que qualquer amor carnal. Não quero parecer um louco nesta história, embora as evidências sinalizem para este estado de saúde. Mas garanto-lhe, minha doce e atenciosa amiga, não acredite na aparência do meu ser. É fundamentada no sentimento maior, que envolve os seres humanos deste planeta.
Oh! Minha querida e estimada xícara
Deixe-me colocar este líquido tão saboroso que acabo de fazer. É melhor que eu tome um gole deste café, e então, reinicie os meus contatos com a minha amante através desta entrevista.
Aí está você!
Toda a platéia e os telespectadores prestam muita atenção às suas respostas. As pessoas ficam atentas, pois sabem do valor de cada palavra emitida. Seu entrevistador, um gordo prepotente e engraçadinho começa pelas perguntas previamente relacionadas, mas durante a entrevista as suas respostas tomam o espaço e o assunto transcorre sem necessidade de ensaio, ou mesmo de qualquer seqüência. Você encontra sempre o melhor caminho para relatar os seus projetos.
Aí está você, e aqui estou eu!
Camaleão camuflado de ser humano
Inocente testemunha das mazelas deste planeta…
Conforto o meu ser nesta obsessão
Mais fácil seria sair e procurá-la
Mas não, não há distância
Apenas corpos que não ocupam o mesmo espaço
Deste espaço limitado
Estamos distantes por opção…
Aí está você, e aqui estou eu!
Rodeado por fotos e cartazes
Amarelados pelo tempo
Que não tem piedade de tomar certas decisões…
Aqui estou eu!
Qual seria a sua reação se eu lhe enviasse uma carta? Não sei. Talvez, preocupada com os seus afazeres atuais, e por não conhecer o emitente, buscaria o lixo mais próximo e atiraria a missiva dentro deste asqueroso, porém utilíssimo objeto.
Não. Creio que não seria uma boa idéia lhe enviar uma carta. Creio que os meus olhos não estão preparados para esta confissão.
Ninguém mais pode saber deste amor. Nem os anjos celestes e nem os demônios infernais. Não. Nenhum deles me entenderia. Possivelmente, me aconselhariam a tomar certas atitudes sem nexo. Não. Os anjos celestes e os demônios infernais são específicos para outros casos.
Aí está você!
Seus cabelos loiros e lisos se comportam tão mansamente. Diferente daqueles cabelos elétricos e raivosos das mulheres contemporâneas. Eles me parecem tão calmos, embora dinâmicos. Transmitem paz, e mais, transmitem amor.
Aqui estou eu!
Interrompo, extremamente contrariado e molhado pelo café derramado, esta contemplação. Pois neste maldito momento, movidos por uma lei maldita, cortaram a sublime energia elétrica de casa.
As velas trouxeram outras imagens. Não eram as suas.