Últimos Minutos...

O quarto permanece escuro... Chove muito! Por todos os cantos só se ouvem gritos, choro, preces de mulheres desoladas, que sentadas em um banco de madeira, cobrem-se com um fino manto de lã, na tentativa de suportar o clima gélido do corredor.

A melancolia, como aura, varre a alma e a mente daquelas pessoas, fazendo-as clamarem por paz. Uma figura alta, de cabelos grisalhos, postada a alguns metros, com metade de um cigarro entre os dedos da mão direita, acompanha tudo com certo incômodo.

A porta do quarto se abre, entram algumas pessoas e novamente se fecha. Minutos depois, é escancarada, para que a maca invada o corredor e leve o doente, um jovem de 23 anos, que arqueja, antevendo o trágico fim.

Uma das mulheres se levanta, possivelmente a mãe, toca-lhe a face, tenta lhe dizer algo; dominada pelo momento, cai em desespero, sendo contida pelo médico, outro jovem, da mesma idade de seu filho.

A maca prossegue seu trajeto, todos se erguem para ver o pobre garoto passar. Abrem-se as portas do CTI, os equipamentos o aguardam... Entubado, o rapaz tenta, mais uma vez, resistir à morte, este mal que o envolve, com sagaz voracidade e sem qualquer ressentimento.

Olhando-o pelo vidro, a mãe reza, à espera de um milagre; oferece sua vida em troca da dele. Mas o céu está reticente. O menino deve mesmo partir!

O tempo corre, o relógio digital da sala de espera marca 20h. Cada vez mais pessoas chegam, todas se aglomeram, esperando o pior... E o que seria o pior? A própria MORTE!

O rapaz, com os cabelos ralos, a pele embriagada por uma altissonância ignescente, absorve cada molécula de oxigênio - enviada pela moderna aparelhagem - como se fosse um enorme presente divino. Seus olhos, intumescidos, transportam-no a um enorme jardim, todo florido, com aroma de rosas selvagens. No céu azul, cumprimentam-lhe os pássaros... Tudo lhe traz a sensação de liberdade que a sociedade não consegue recriar com todo o dinheiro que lhe corre as veias.

O equipamento que marca os batimentos cardíacos apita, a correria aumenta, todos tentam evitar o inevitável: sua morte! O que era temor, torna-se realidade em poucos minutos.

A mãe do garoto surta pela dor, sendo contida pelos braços fortes daquela figura alta, de cabelos grisalhos, seu ex-marido, a quem não via há mais de 20 anos e que, por obrigação, encontrava-se ao seu lado, sem que qualquer lágrima lhe caísse sob o envelhecido rosto.

Cabisbaixo, o médico responsável pelo plantão recolhe-se ao consultório após assinar o motivo do falecimento: Parada cardiorrespiratória, em decorrência de infecções causadas pelo vírus da AIDS. Infelizmente, mais um a entrar para as estatísticas oficiais...