Uma Nova Chance para Silvana - Continuação
De repente, o grito:
- Meu Deus!! O que é isso!??
Ela assustou-se procurando o autor da frase, quando percebeu que todos olhavam horrorizados para ela. Não podia acreditar que a estivessem vendo, mas estavam. As feições de pânico demonstravam isso de forma inequívoca. E hilariante, claro, pois em seguida deu-se uma cena de total desespero, cada um correndo pra um lado. Os policiais posicionaram-se atrás das viaturas, os bombeiros rolaram o pequeno desnível ao lado da pista, os curiosos desapareceram. De armas nas mãos, os pobres representantes da lei tremiam mais que coelhos assustados. Silvana riu... Silvana gargalhou... Silvana não resistiu e fez:
- Bu!
E o desespero presenciado há instantes deu lugar a uma epopéia de loucos, correndo e gritando pela estrada. Vários entraram em seus carros e começaram a manobrar desastradamente, batendo uns nos outros. Silvana não conseguia evitar, era mesmo tudo muito engraçado e ela continuava, agitando os braços luminosos:
- Bu! Buuuuuu!
De repente, um tiro. Algum dos policiais atirou contra ela. O barulho a assustou, fazendo-a parar com a brincadeira. A bala atravessou suas costelas, ou o local antes ocupado por elas, e foi cravar-se numa árvore mais atrás. Não sentiu dor, mas, de algum modo, percebeu a passagem da bala. Outro policial atirou também. Silvana olhou para eles e gritou com uma energia até então desconhecida:
- Querem parar com isso, por favor?
Foi o suficiente para que a coragem ainda restante aos pobres homens escorregasse de vez por suas pernas e, também eles, enfiaram-se em seus carros e saíram em disparada, as sirenes ligadas.
Silvana estava, então, novamente sozinha. Bom... Pelo menos agora poderei certificar-me de que o corpo sob o lençol é mesmo o meu... - ponderou. Caminhou até o monturo ao lado das ferragens. Abaixou-se até tocar a ponta do lençol, mas tomada de uma forte angústia e apreensão, não pode levantá-lo. Sempre que ficava assim ansiosa, Silvana costumava respirar profundamente algumas vezes, até que o corpo estivesse novamente sob seu controle. Mas tudo agora era diferente. Não havia respiração e, pior, não havia reação corpórea denunciando sua aflição. Então, só lhe restava tentar dominar suas emoções, já que elas não mais se somatizavam. Levantou-se e deu uma volta no carro, tentando se convencer da importância desse pequeno ato. Aliás, tentava se convencer da pouca importância, uma vez que já estava convicta de haver desencarnado. E, aos poucos, foi novamente se aproximando do corpo no chão. Finalmente, conseguiu tocá-lo. Primeiro sob o lençol. Depois, levantando o pano lentamente, pode reconhecer as próprias roupas, os cabelos, seu rosto. Completamente desfigurado pelo impacto, mas era a mesma cara feia que costumava ver diariamente no espelho. Sorriu. Nem se achava feia. Mas costumava referir-se a si mesma desta forma quando viva. Que dirá agora, quando suas alternativas eram aquela maçaroca de carne, sangue e cacos de vidro sob o lençol ou, ainda pior, um grande boneco de gelatina reluzente? Riu. Riu mais. E, em poucos instantes, gargalhava quase histericamente de toda essa estranha situação.
- É mesmo tão engraçado? - uma voz conhecida e, há muito, esquecida perguntou.
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(Continua - só mais uma vez, prometo!)