O amor platônico da sinhazinha
O criado negro maltrapilho ajuda a alva donzela a descer da carruagem. Um pobre sorriso que contrasta com uma basta face amarrada da sinhazinha.
Já está escurecendo e logo o pai Barão estará em casa pro jantar, sem imaginar e sem poder suspeitar que a filha tenha um amor platônico. Um amor proibido pela pressão racial e social imposta.
O que a conforta é que amanhã é outro dia e ela terá que subir na carruagem para mais um passeio. Mais uma vez ela sentirá os calos ásperos do amado subordinado acarinhar suas mãos delicadas como pétalas de rosa. E munida de postura neutra e altiva, se deixará viajar em seus desejos íntimos, através do cândido sorriso inocente que lhe apetece um beijo.
Ao fechar os olhos, não só o beijará, mas usufruirá de todo o corpo moreno e bem esculpido de seu serviçal, em devaneio.
Já é tarde. Da janela do quarto do casarão dá pra ver e ouvir que tem festa na senzala. Suspirando, agora ela veste um olhar de felicidade. Sonhando apenas em ser uma princesa africana com seu príncipe já coroado pelo seu coração.O vento sopra a cortina e seus longos cabelos loiros. Abraçando o macio travesseiro de pena de ganso, ela apenas sorri para o horizonte.