Amor de carnaval
Terça-feira de carnaval. Último dia da folia e lá estava eu, num clube que não tinha nada a ver com meu roteiro, curtindo a maior fossa por causa da garota que marcou comigo e não apareceu; "enchendo a cara" de cerveja com um amigo. Nessas horas, sempre aparece um amigo para beber junto com a gente.
Eu estava inconsolável. A garota que se dizia minha namorada "se mandou" sem me avisar. Foi curtir seu carnaval na Região dos Lagos, um ponto turístico badaladíssimo durante as altas temporadas. Isso depois que arrumei convites para seus irmãos curtirem as quatro noites sem pagar a entrada. Não preciso dizer que me senti a bola da vez. E como isso é desagradável.
Pouco antes da meia-noite, nós dois, meu amigo e eu, subimos as escadas e ficamos na parte alta do clube, de onde podia-se observar o salão inteiro. O baile estava bem cheio e a banda bastante animada. Pessoas se abraçavam, sorriam, brincavam mesmo ao som das marchinhas. Ele saiu para pegar mais duas caipirinhas e eu, sei lá por que, olhei numa direção onde havia uma morena linda abraçada com um senhor e uma provável colega. Formavam aquele típico cordão que fica girando o tempo todo enquanto os músicos se acabam naquelas batidas e sopros que fervem o corpo da gente.
Eu pensei que estava alterado quando vi aquela menina linda fazendo sinal para eu descer. Despertei automaticamente da depressão alcoólica, olhei de novo e ela repetiu o gesto. Olhei para trás, para os lados e apontei para meu peito como a perguntá-la "é comigo?", ao que ela respondeu positivamente com a cabeça. Não sei o que aconteceu entre descer as escadas e encontrá-la no salão. Lembro-me apenas que, quando dei por mim, estávamos eu e ela abraçados e cumprindo aquele ritual tribal, rodando o salão.
Parecia um sonho! Fiquei realmente maravilhado. Ela, tão linda, tão cheirosa... aqueles cabelos lisos e sedosos, um perfume delicioso... E ficamos os dois. Não sei onde foram parar seus acompanhantes, que mais tarde descobri serem seu pai e uma vizinha.
Não acreditava em amor à primeira vista até aquela data. E outra coisa da qual me lembro, foi quando um desses caras que não arrumam nada, apareceu para atrapalhar e deu a ela um pedaço de papel. Não sei explicar o motivo, mas senti-me enciumado. E ela, no mesmo instante, amassou o papel na cara do cretino e me entregou. Aquilo foi o máximo! Fui tomado por uma satisfação explosiva.
Depois, meu amigo apareceu. O baile estava no final. Ri muito dele porque não conseguia pronunciar o nome daquela menina de jeito nenhum. Ela tinha o sorriso mais lindo e iluminado que eu já vi. Então, chegou a hora de ir embora. Não sei como, mas ela conseguiu convencer seu pai a vir caminhando conosco. E a distância era bem razoável. Uns dez quilômetros do clube até sua casa. Mas eu estava apaixonado. Se tivesse que ir a pé do Rio a Salvador eu iria...
Chegamos e o sol estava no céu. Demoramos para nos despedir. Sua casa ficava num bairro próximo ao meu. E percebi que o acaso não existe. Tinha que acontecer! Foi um ano que não deveria ter acabado nunca! O tempo deveria estancar ali. Fui muito feliz...
Mas... o mundo deu voltas... Muito foi o que aconteceu daquele carnaval pra cá. Ela casou-se com outro e foi embora da cidade. Eu, "quebrei a cara" algumas vezes, mas nunca a esqueci. Ela mandava-me cartas, nos primeiros meses depois de sua partida. Eu passei a ligar naquelas datas como dia das mães, aniversário, Natal... e a vida seguiu seu rumo.
Vinte anos depois, nos encontramos e pudemos viver grande parte dos momentos que não vivemos, quando éramos descomprometidos com a vida. Encontrei o amor definitivamente. E novamente, deixei-o partir. Vai entender... Tudo acontece para atrapalhar quem ama. Família, celular, amiguinhas (dela), ex marido, ex namorado... O amor também se aborrece. E entre uma briga e outra... Lá se foi ela, outra vez. Que mal a gente se fez...
Hoje em dia, ela é uma princesa que conduz sua própria carruagem entre as capitais. Continua linda... Inesquecível e bela. E eu, tento aprender a viver sem ela, arriscando-me como escritor no site mais bacana que encontrei, numa terça de carnaval, com a "cara cheia de cerveja", procurando poesias para mandar para o e-mail dela, meu primeiro, grande e único amor.