Meu suicídio

Tudo era lôbrego.

Naquele dia eu não sabia mais o que fazer e saí correndo da sala, me tranquei no meu quarto que era, de fato, o único lugar onde eu me sentia bem; envolto por meu negro, minhas caveiras e os pôsteres dos meus ídolos. Lá eu me sentia bem, embora já não agüentasse mais aquela minha vida caótica. Quando tranquei a porta, meu pai ficou lá, gritando, batendo e mandando que eu abrisse; não sei o que ele queria, qual forma nova de me humilhar ele iria inaugurar. Eu tentava me colocar por cima e não sofrer, mas eu estava caindo num vasto abismo; ninguém segurava minha mão e eu estava indiferente à tudo, na verdade. Eu precisava ao menos sentir o abraço do medo mais uma vez, todavia, nada me preenchia; eu estava sem lágrimas, sem ódio, sem amor, sem nada. Estava esquecido no tempo e era único. Naquela hora eu só pensei em uma coisa! Subi na cadeira do computador e peguei, em cima do guarda-roupa, a caixinha que eu escondia de minha madrasta; coloquei o segredo, destravei e tirei a chave do meu baú. Desci da cadeira e peguei baú debaixo da cama; era lá que eu guardava meus cadernos de poesia e outras coisas que não poderiam ficar à mostra. Abri o baú e lá estavam meus seis cadernos; fiquei observando por um tempo e até li algumas poesias, todas falavam de uma só coisa: morte. Será que seria daquele jeito mesmo? Enfim, tirei os cadernos e o fundo falso do baú; o que me interessava estava ali. Seringas, comprimidos e lâminas. A heroína já tinha acabado e só restaram alguns valiuns e dois comprimidos de êxtase; o pior é que tudo se acabou em menos de uma semana. Realmente, aquela semana foi conturbada. Restava apenas a vontade de morrer e de acabar de uma vez por todas com aquela vidinha medíocre que eu tinha; ali estavam as minhas lâminas. Eu liguei o som, coloquei a trilha sonora de “Queen of the damned”, na música “change” – aquele cd e aquela música, especificamente, me acompanharam nos piores momentos e a sensação que eu tinha escutando-a era maravilhosa, principalmente depois de uma boa dose de heroína. Tomei os comprimidos de uma vez, tinha que ser fatal. De repente eu já estava num outro mundo onde tudo se passava em slowmotion e... Aquelas pessoas no quarto... Eu as conhecia! Tarja Turunen, Floor Jansen, Simone Simions, Lisa Schaphaus, Marilyn Manson, Dani Filth e... Lestat! Puta merda, meus ídolos tinham saído dos pôsteres e estavam vivos, ali, ao meu redor! Dani se aproximou de mim e sussurrou em meu ouvido com aquela voz rasgada tão excitante “suicide, sucide (...) The sacrifice of blood”. Era hora. E mais excitante era ver Lestat vestido por um negro denso, perfeito, magnânimo. Eles estavam ali para me dar força, eu sabia, por isso, meticuloso, peguei a lâmina mais nova e, ouvindo o próprio Lestat dizer em meu ouvindo algo como “I watch you change like you never...”, passei-a em meu pulso esquerdo ; não há sensação melhor que sentir a lâmina quente dilacerando a carne, rompendo a artéria pulsante, ver meu braço se vestindo de um vermelho-vivo, escarlate. Por incrível que pareça, eu me sentia vivo; tão morto que a vivacidade se alastrava dentro de mim, eu estava nascendo. Nascendo ao som dos lirismos arrepiantes das mulheres ali comigo, enquanto Dani e Marilyn espalhavam meu sangue por suas bocas e se beijavam com voracidade e Lestat vinha, insinuante, morder meu pescoço. Era ali que eu ficaria, em silêncio, longe do mundo, longe de tudo.