Tratados sobre o Amor
Então o avistei na esquina. Vinha na minha direção, o andar gingado, as calças jeans surradas, o cabelo comprido, despenteado e solto no vento. Nem me viu. Eu não pensei duas vezes; se pensasse, jamais faria. Saí correndo, avoada, louca, desesperada. Queria um, dois, três longos beijos de amor. Saltei no colo dele tal qual o cachorrinho da vizinha fazia quando me via. E eu, quando me dei conta, estava pendurada naquele pescoço cheiroso, beijando aquela boca gostosa, enfiando meus dedos naquela cabeleira sedosa. Mas os beijos de amor dele não vieram, os abraços não chegaram, as mãos me afastaram. Caí sentada no chão, encarando aqueles ferozes olhos verdes, as pessoas passando ao meu lado, debochando da minha vergonha. Ele foi embora, eu levantei. Peguei a bolsa que estava caída num canteiro e saí de fininho. Caminhei algumas quadras sem olhar para trás, cabeça erguida, fingindo uma dignidade que não existia mais. Me enfiei numa pracinha, no meio da criançada, afundei num banco. Peguei minhas folhas cor de rosa, minha caneta da Hello Kitty e fui tentar curar meu vexame escrevendo tratados sobre o amor