O rato

Ao se levantar naquela manhã chuvosa e preparar o café, Arnóbio constatou, que um roedor entrara na casa, pois a batata-doce da cesta estava roída; havia fezes no chão, que indicava ser de rato. Pelo tamanho da desordem, não parecia ser mais que um. Procurou atrás do armário e da geladeira, dentro do fogão e em outros orifícios. Nenhum sinal. Melhor assim, pensou Arnóbio, talvez tenha ido embora. Jogou fora a batata roída e cozinhou a intacta.

Quando tomava o café, o rato passou correndo, Arnóbio levantou rapidamente, pegou a vassoura e a desferiu no roedor, mas errou o alvo e quebrou o cabo. Nessa altura, o rato não poderia sair de dentro da casa, pois Arnóbio trancara portas e janelas, mas não conseguiu encontrá-lo. Voltou a tomar o café, que esfriava na mesa, enquanto pensava no que fazer. Sentiu um gosto estranho ao morder a batata; desistiu de comê-la. Então teve uma ideia: foi a uma loja de produtos veterinários e comprou um veneno, uns rolinhos rosas, segundo o vendedor, fatais. Ao retornar, inspecionou novamente a casa e nenhum sinal do rato. Bicho escroto, não vai escapar dessa, disse Arnóbio em pensamento.

Ao anoitecer, escondeu os alimentos em locais seguros, e colocou o veneno com pedacinhos de queijo numa tampa plástica reciclável, debaixo da mesa. Antes das vinte duas horas, foi pra cama. Ao acordar na manhã seguinte, viu que o animal comera o veneno todo. Agora sim, te peguei, seu escroto, disse em voz alta, como se fosse para o rato escutar.

Na noite seguinte, repetiu a operação, mas esqueceu uma laranja sobre a pia e ao acordar, viu que fora roída, e o veneno

ingerido. O rato continuava vivo e atuante. E assim sucedeu durante uma semana. O rato sobrevivia. Comprou veneno mais forte, escondia os alimentos e o animal devorava e desaparecia. Arnóbio revirou os móveis e nada de encontrar o não humano. Não se desesperou, sabia que de uma forma ou de outra o rato não escaparia, pois não tinha água nem comida, só veneno, com a casa trancada. Até que numa noite acordou com um barulho na cozinha. Desceu as escadas e encontrou o rato abrindo com as patas, o armário da despensa. Um rato do tamanho descomunal. Pelo tamanho que adquira, ele não poderia mais se esconder nos vãos da casa. Agora o humano e o não humano dividem o espaço.