LEMBRANÇA ABSOLUTA (from Lembranças de Vandin)

Dos anteontens até, pouco há p’ra se lembrar.

Dos próprios ontens não carrego muito certo nenhum porquê.

O que recordo absoluto são senões quase de infância.

Casa de engenharia própria; boa sala, abraçada por cozinha e corredor; um vestíbulo feito quarto, onde a filha despencava um sono frouxo e sem espaço; e o quarto, quarto mesmo, onde mãe e pai desfrutavam uma intimez de dormitório.

Foi de dentro do furo fechadura do banheiro que, preso nos intestinos, eu vi a cama vazia que ensaiô minha paixão inexplicável pela filha que eu nem nunca tinha visto; nem pelo ventinho da cortina do quarto-vestíbulo, nem por artimanha de algum outro enxergamento – que tava lá pr’a a escola a guria.

De noite o pai falô:
– Lazinha, esse é seu primo Vandin; vai ficá no ranchinho lá no fundo, até tio Tenório escrevê, pra eu mandá ele de vez lá pra a cidade do Rio.

Se lembro ainda é que a carta nunca que chegava; e o pai morreu sem impedir minha paixão por Lazinha, a lembrança absoluta.

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