Avó emprestada
No dia em que soube que o coração dela falhou, ficou sem chão, bem isso. Sempre batia em sua casa, e ela nunca o decepcionava: uma fruta, um pãozinho, uma moeda – se não tivesse à mão algo para comer – qualquer coisa sempre lhe oferecia, mas o que mais o impressionava era o sorriso de pura bondade. Em suma, sentia-se acolhido.
Agora, dava-se conta de que esvaziavam a casa, havia uma movimentação estranha. Apertava-lhe o peito ver aquilo, e não poder mais encontrar a sua amiga. Até a sua mãe, que nunca dispunha de muito tempo, ocupada em trabalhar para terem comida em casa – o que estava muito difícil – até a sua mãe tinha olhado bem para ele e perguntado o que havia. Ele não disse nada, ela insistiu, perguntando se tinha aprontado algo. E ele terminou falando, a sua avozinha tinha morrido. “Que Deus a tenha”, murmurou ela, sabia da existência da senhora, ele já havia contado sobre ela.
Passava pela casa bonita quando a mãe lhe pedia para fazer algum mandalete. E, num desses dias, reparou que enchiam um caminhão com móveis e pertences variados. Pôs-se a observar. Um homem com cabelos quase brancos que andava por ali, dando instrução aos rapazes da mudança, dirigiu-se a ele: “Queres ajudar, guri?” Estranhando, ele assentiu com a cabeça. “Vem cá, junta esses brinquedos.” E mostrou-lhe, no fundo da casa, uma peça cheia de bugigangas. Entregou-lhe um pacote de sacos grandes, ao que ele perguntou: “De quem são esses brinquedos?” “De meus filhos, quando eram pequenos, menores do que tu.”
Foi reunindo os objetos, era uma forma de prestar um serviço para aquela senhorinha de quem tanto gostava. Ficou um bom tempo ocupado, até que se lembrou: “Tenho que ir para a escola.” “Ótimo”, respondeu o homem. “Tu não és um daqueles meninos que a minha mãe ajudava?”“Sou, ela era muito boa para mim.” “Então, vem cá.” Conduziu-o até o fundo do pátio e parou diante de uma bicicleta, apoiada em uma árvore: “Tens uma?” Ele, surpreso: “Não tenho não senhor.” “Essa bike estava esperando por um dono. É um presente da minha mãe para um amiguinho."
Deu-lhe uns trocados e entregou-lhe oficialmente o presente. Felicidade igual nunca tinha vivido.