Vidas
Anos depois, ela talvez se arrependesse. Bem provável que desfiasse as memórias e tivesse saudade do que não foi. Era difícil, quase impossível, a seu ver, conciliar tudo que se apresentava, diante da sua inexperiência: estava em jogo o seu futuro. Pensou, pensou, e terminou se mantendo no espaço que ocupava. Ganhou três crianças que lhe preencheram o tempo, crianças que cresceram e começaram a encaminhar-se para as suas próprias vidas. Só alguns anos mais tarde, quando o primeiro dos filhos chegou à universidade, encontrou pelos corredores uma antiga professora. Estava idosa, mas não perdera o gosto pela roupa extravagante, os gestos exagerados.
– Menina, a minha aluna do segundo grau! Vês como não te esqueci?
– Um prazer encontrar a senhora!
– Só quero saber uma coisa, fizeste o curso de História?
Ela encabulou, adorava História, mas terminou não fazendo o curso, arrumou trabalho, empreendeu outros cursos, mas a História ficou pelo caminho.
– Que pena, eu já te imaginava historiadora!
A professora abraçou-a e seguiu pelo corredor da faculdade, decepcionada, decerto, e ela postou-se em frente à secretaria, pensando de tudo um pouco, até que a chamaram, ela desincumbiu-se da tarefa que viera cumprir, atravessou a rua e dirigiu-se para casa. Anos depois, ela talvez se arrependesse. Ou não. Por enquanto, estava ocupada demais.