O Labirinto

E como se não bastasse o abafado daquela tarde, faltara luz, o que a fizera voltar mais cedo para casa. A impossibilidade de ocupar-se com o trabalho a fazia perder-se em pensamentos sem sentido ou

utilidade.

Fora até o banheiro lavar o rosto para amenizar o calor que a sufocava quase tampando-lhe a respiração. Uma vontade de falar lhe tomava, mas a boca há muito não dizia palavra sequer.

Olhou para o espelho da pia tentando ver seus traços, como era seu rosto? Não lembrava . Ela só conseguia ver o reflexo da funda melancolia de seus olhos negros. Na noite anterior ela teve aqueles sonhos repetitivos, talvez também tenha tido em outras noites,

mas há meses ela não se lembra de ter sonhado. Talvez não tenha tido tempo de pensar se sonhou,as vezes só pensamos quando não temos o que fazer, como num dia improdutivo.

No sonho, ela estava perdida em um lugar que não conhecia, andava a procurar a saída, mas só tinha corredores. Ela andava tentando chegar ao fim de um deles, porém quando se aproximava, difusamente o

corredor se desmembrava em outros idênticos e ela continuava a andar seguindo os corredores que iam surgindo.

Em alguns dos corredores havia portas, mas elas estavam trancadas e não havia nelas o lugar de encaixe de chave, logo, ela não conseguia espiar pela fechadura. Depois que muito andava o aspecto deles

mudava repentinamente: ficava mais escuro ou mais claro, mudava as cores e as texturas das paredes e o chão do lugar, antes sólido, começava a apresentar movimentos como se toda a estrutura fosse sucumbir.

Viu um imenso corredor horizontal claro azulado e o seguiu, seu final se dobrava como uma curva.Continuou a trajetória sinuosa, mas esbarrou em uma parede com um imenso espelho pendurado.

Assustada, olhou sua imagem e o longo corredor que havia caminhado atrás de si. Sentiu o medo que lhe tomava o corpo, sua garganta seca se fechava, seus ouvidos escutavam ruídos altos como se alguém

cochichasse ao seu ouvido; havia gente ali? Ou ela estava escutando seu barulho interno? A menina apareceu no espelho com seu olhar ingênuo e esperançoso olhava para ela timidamente. Aqueles olhinhos pretos e miúdos, sardas, cabelos arrepiados, pés descalços com seu vestido florido.

Pôs a mão sobre o espelho e tocou a dela.