UM VESTIDO BRANCO NO DESERTO

Ela chegou até aquela porta em forma ovalada tendo se esgueirado pelas estreitas ruelas, abrindo passagem entre a multidão que se movimentava sem nenhuma ordem naqueles espaços apertados, divididos com as tendas dos vendedores de tapetes, cerâmica e todo tipo de produtos existentes naquela região desértica. Usava um vestido branco de tecido leve e seus olhos buscaram ansiosos o espaço ao redor, como para se certificar de alguma coisa. Enfim empurrou a porta e entrou.

O interior era claro e sem nenhum conforto. Havia uma mesa lisa, cadeiras rústicas e uma cama de onde um homem ergueu-se sorrindo e estendeu-lhe as mãos. Olharam-se por um breve istante e então um beijo longo os uniu, sendo seus contornos realçados pela intensa luz vinda de uma janela ao fundo, coberta por leve cortina transparente.

Haviam esperado muito por este encontro após semanas, onde foram reconhecendo um no outro o nascimento de uma paixão tão ardente quanto aquele sol que queimava o deserto.

Ele levou-a para cima da cama e num gesto baixou seu vestido pelos ombros e o fez com tanta vontade que acabou rasgando o tecido. Houve um momento de hesitação em que se olharam intensamente, primeiro surpresos e em seguida totalmente envolvidos por aquele fogo que queimava a pele e que os fazia impacientes há dias em realizar aquele encontro . Terminaram de se despir, enquanto procuravam-se desesperadamente, numa urgência aumentada por dias de espera, de olhares intermináveis quando reunidos em grupo para conversar, beber vinho e em que se continham a custa de muito controle, devido à presença do marido dela e de amigos que procuravam nesses momentos ouvir sossegadamente o som da própria língua, perdidos naquela região tão exêntrica para seus hábitos ingleses. Um vaso de flores amarelas sobre a tosca mesa, veio a ser então testemunha da tempestade cujos raios fulgurantes iluminaram tudo, quando aqueles corpos finalmente nus e entregues ao prazer de se possuirem encontravam seu êxtase. E assim ficaram por longos momentos até adormecerem profundamente.

As orações vindas da mesquita acordaram-nos e ela saltou apressada vendo que já anoitecia. Ele, com muito carinho, passou a mão pelos seus cabelos, beijou-os e depois as mãos brancas nas palmas, e indicou-lhe uma pequena caixa de onde retirou linha e agulha. Pegou então o vestido com todo cuidado e com agilidade inusitada foi costurando o tecido rasgado, enquanto ela esperava sorrindo, vestida com suas roupas íntimas. As flores amarelas sorriam também. A cortina leve estremecia com suave brisa que já prenunciava o frio da noite.

Terminada a costura, ele desceu o vestido pelo corpo da amada, pegando em seus braços, primeiro um, depois o outro, e passando pelas aberturas com cuidado. Cada gesto revelava agora uma ternura só possível entre pessoas que vivenciaram juntos o verdadeiro encontro das almas através dos corpos. Então ela se ergueu e beijaram-se longamente. Ela ainda olhou para trás ao abrir a pequena porta, e depois sumiu no burburinho que a noite iluminara com lâmpadas espalhadas como estrelas amareladas nas trilhas do mercado.

Uma imensa lua cheia olhava pensativa para baixo, na sua sabedoria de velha dama que conhece os labirintos do amor e da vida. Mas nada poderia mais apagar a intensidade que unira os amantes para sempre, pra muito além dessas trilhas passageiras...

tania orsi vargas
Enviado por tania orsi vargas em 29/09/2007
Reeditado em 06/04/2008
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