A figura
Ele dá um sorrisinho para os jornalistas e desaparece. Não que goste de ser questionado, interrogado, sabatinado, mas são cavacos do ofício, como se dizia antigamente. Uma questão de não desaparecer dos jornais, de manter a imagem constantemente presente. Ele para no meio do escritório, conjeturando: ‘Tudo é uma questão de imagem.’ A secretária lhe oferece um café e ele se senta para tomá-lo.
– Doutor, aquela jornalista telefonou, quer falar com o senhor.
Revira-se na cadeira e procura temporizar: – Qual jornalista?
– A Roberta Costa, que veio ontem aqui.
Sua fisionomia endurece: 'o que quer essa mulher aqui, de novo?' Dispara para a secretária:
– Diga que estou muito ocupado esta semana, na próxima vou viajar. Ela pode telefonar no fim do mês.
Pega a agenda e visualiza os próximos compromissos, dentre os quais almoços e jantares. E procura deixar de lado aquela investigadora que quer desencavar a sua vida pregressa. Agora é o senhor secretário e ninguém vai perturbar os seus planos. Veste o seu sorriso de homem bem-sucedido e esforça-se para caber no figurino que escolheu para si mesmo.