A marcha
Ela gostava de contar formigas.
Passava horas vendo as minúsculas criaturas em marcha rumo a um buraco, onde ela sabia ser a casa delas. Às vezes, por um descuido de alguma, acontecia um tumulto e ela perdia a conta, que era reiniciada logo depois, quando as próprias formigas se reorganizavam e retomavam a marcha.
Umas levavam pedaços de folhas; outras, materiais que não podiam ser identificados, mas todas participavam de alguma maneira. As pessoas são parecidas com as formigas; nem sempre, mas, às vezes, parecem; ela pensava, absorta na sua rotina.
Se alguém perguntasse o que ela estava fazendo, ela dizia que estudava a vida em sociedade. Geralmente, quem perguntava, sorria, pensando, essa menina é meio avoada. Ela era muito nova para ter aquele tipo de pensamento, sua mãe se preocupava; seu pai também, mas achava divertido, na maior parte do tempo.
“O que essa menina tanto faz nesse quintal?”.
“Ela tá estudando a vida em sociedade, querida”.
“Olhando para as formigas? Isso não é loucura, não?”.
“Meu bem, há um tipo de inteligência que está muito próxima da loucura, há até quem confunda uma com a outra. A nossa filha tem esse tipo de inteligência. Ela vai ficar bem, eu te garanto”.
Enquanto isso, a menina corria pelo quintal atrás de borboletas, alheia à incompreensão do mundo. Na sua busca, ela improvisava uma canção, feliz como qualquer criança.