“Amigos”

A história deles era das mais banais. Eram amigos desde tenra idade. Estudaram sempre na mesma escola. Falavam-se todos os dias, o dia todo, adentrando pela noite e até à madrugada. Se conheciam tanto quanto a si mesmos. Esse foi o grande estopim para o que aconteceu depois. Muita proximidade, intimidade, abraços, carícias de amigos... Ela crescendo, ele também. Os corpos se transformando, ela virando um mulherão, alvo de todos os olhares, motivo de muitos sonhos e paixões platônicas; ele se tornando um rapaz, boa pinta, provocando suspiros nas meninas da escola. Enfim, um dia seus corpos se encontraram e num vislumbre da carne, quando a razão dá um tempo e a emoção toma conta, um calafrio correu por seus braços e pernas, que começaram a tremer, o coração disparou e tudo começou a mudar. No princípio, eles fingiram que continuava tudo igual, mas o tempo foi passando, como acontece sempre para os vivos, e eles não se entendiam mais, ou se entendiam de outra maneira. Os abraços começaram a gerar calor excessivo e se demorarem mais do que de costume; e as longas conversas se tornaram ruidosos silêncios, onde um contemplava o outro sem se lembrar do passado, mas projetando o futuro, depois sentindo-se culpado, sem saber exatamente porque. De repente, ele começou a sentir ciúmes dela e ela dele. Quanto mais eles queriam se ver menos se viam, se distanciavam aos poucos e já não eram os mesmos um com o outro, eram outros consigo mesmos. Um dia ele a beijou na boca, ela retribuiu, mas teve medo, “por que você fez isso?”, perguntou, mesmo sabendo a resposta. “Porque te amo e não consegui me controlar”, foi o que ele disse, tentando convencê-la, mesmo sabendo que ela sentia o mesmo. “Não, a gente não pode”, ela disse. “Por quê?”, ele quis saber. “Porque não”, ela disse e saiu correndo, como se quisesse fugir. Eles já não se falavam, não se viam, estavam separados pelo amor; eles, que eram como uma só pessoa, agora eram duas, mas com pensamentos iguais, e uma saudade longa percorria suas vidas inteiras, desde que o sentido de existência começou para ambos, desde que entenderam que no mundo havia o outro e que esse outro seria como eles mesmos. Além dessas lembranças, havia a perspectiva do próximo dia, a expectativa com relação ao amanhã. As noites eram cheias de sonhos e suspiros, e a vida começou a não fazer mais sentido. Todo mundo ao redor percebeu a mudança, mas já esperavam, porque essa é uma história comum, tanto na realidade quanto na ficção. Ele queria ela, ela queria ele; ele dera o primeiro passo, ela precisava fazer um movimento, só assim eles ficariam juntos. Os dias se passaram e a saudade cresceu de um jeito que ela não suportou, e, atendendo aos apelos do coração, ela o procurou e eles se abraçaram forte, se beijaram com paixão e se amaram. Começaram a namorar e o fim dessa história ainda não chegou, mesmo sendo uma história das mais banais.

João Barros
Enviado por João Barros em 07/01/2019
Código do texto: T6544999
Classificação de conteúdo: seguro