A providência na travessia

*Série de microcontos intitulada Providência.*

Selma não tinha idéia de que naquela manhã algo diferente e inusitado aconteceria em sua vida; caminhava tranqüilamente pela rua em direção à casa de seu irmão que morava do outro lado do bairro; no caminho uma linha férrea fazia divisão entre os lados leste e oeste da cidade e geralmente muitas pessoas se aglomeravam num lugar até certo ponto perigoso onde faziam uma travessia arriscada, mas não havia nenhuma outra alternativa; naquela época o então bairro de mesquita, hoje município não possuía uma passarela que permitisse uma passagem segura acima da estrada de ferro, e tanto Selma quanto as outras pessoas passavam naquele ponto toda vez que desejassem ir para o outro lado da cidade, ou poderiam andar até o centro do bairro e então passar por um viaduto onde o transito era outro empecilho para os pedestres, visto que também não havia local apropriado para a passagem dos transeuntes. Mas o tempo de fazer esse trajeto não compensava.

Parada junto de algumas pessoas próximas a estrada de ferro ela permanecia esperando que os outros começassem a travessia para que ela pudesse acompanhá-los.

De repente como um impulso coletivo muitos dos que estavam ali esperando resolveram se aventurar, e irromperam numa corrida frenética para passar ao outro lado, Selma totalmente distraída, não pensou duas vezes e no momento exato em que esboçou o primeiro passo sentiu uma mão segurá-la pelo braço impedindo que fizesse a travessia junto com os outros; voltando-se para ver quem a deteve, ela viu um homem que apontava para o lado direito; em seguida o trem passou com uma velocidade incrível fazendo vento e muito próximo de onde ela estava; certamente do modo como ela atravessaria não teria tempo hábil de chegar ao outro lado e seria pega pelo veículo; as pessoas que ousaram, quase não conseguiram completar a passagem e correndo precipitaram-se aos trancos e barrancos fugindo do gigante de metal que quase lhes tirara a vida. Do outro lado esbravejavam toda sorte de impropérios contra o trem e seu condutor como se deles fosse a culpa por sua própria falta de paciência.

No momento seguinte a passagem do trem, Selma voltou-se para agradecer ao estranho por tê-la salvo de cometer aquela tolice, mas para seu total espanto não o viu mais, havia literalmente desaparecido; perguntou para as pessoas que ainda não tinham passado, mas ninguém viu tal homem.

Finalmente depois de uma passagem segura após a providencial intervenção ela seguiu para a casa de seu irmão e nunca mais se esqueceu desse fato.

Luiz Cézar da Silva
Enviado por Luiz Cézar da Silva em 10/08/2007
Reeditado em 02/11/2007
Código do texto: T601878