O pequeno João tinha um problema. Com seis anos, nunca sonhara colorido. Tudo o que via em seus sonhos, bichos, flores, gente, não tinham cor, eram pretos ou brancos, como as fotografias que sua avó guardava em um álbum que, vez ou outra, abria para lembrar-se dos parentes mortos.
João pensou em falar com a mãe. Tinha certeza que ela sonhava colorido. Como todo mundo.
Mal adormeciam e logo vinha uma enxurrada de cores, vibrantes e alegres, e o sonho seguia, até a manhã. Ia falar com a mãe, sim, e ela ia dar um jeito.
João falou, mas nada aconteceu. Sua mãe disse que era só uma questão de tempo. Quando crescesse, ia sonhar colorido. E ele esperou. E enquanto esperava, sonhou mundos e mundos, sempre sem cor.
Quando já não suportava a tristeza de sonhar assim, uma noite, sem aviso, sonhou colorido.
Viu um mar imenso, azul, e um campo verde como esmeralda. Acordou feliz, mas logo se assustou. À sua volta, o quarto estava quieto e em preto e branco.
Correu até a mãe – também sem cor – e contou que sonhara colorido. Ela sorriu e o beijou com carinho.
João sentiu-se confortado com o beijo e, sem dizer mais nada, saiu para brincar naquele infinito mundo em preto e branco.