"O BADALAR DOS SINOS ASSOMBRADOS"
Dezoito horas,quando o sineiro Pedro pucha a corda do seu sino na nave de Deus,marcando com o seu badalar,a hora do Ângelo naquele vilarejo.Na pequena igreja,pairava uma luz tênue que provinha dos castiçais que hora ornavam o altar mor daquela pequena igreja.Sobre o altar,havia uma toalha branca em rendas,confeccionadas pelas artesãs do lugar.Ao lado dos bancos de madeira de jacaranda,alinhados milimétricos pelo cuidador Pedro,se encontrava um confessionário do século passado que trazia em suas laterais de madeiras,entalhes em alto relevo da crucificação de Jesus.
Enquanto as luzes dos castiçais fulguravam na pequena e singela nave de Deus,o ecoar dos sinos expandiam por toda a cidadela,anunciando o momento de orações.Por entre os bancos laterais,nos corredores,adentrava naquele momento,uma velha senhora a qual com seus joelhos,dobravam ardorosamente um tando endurecidos pela idade,e o peso da sua vida,repousava-os sob um banco em frente ao altar-mor da capela.Era dona Zefina,com os seus oitenta e dois anos de vida sofrida,moradora do lugar.
A capela era encravada no alto do morro,o que dificultava,não somente dona Zefina,como os demais moradores daquele lugar,as suas escaladas naquela casa de orações.Já diziam por aquelas bandas,que vários objetivos milagrosos eram alcançados em detrimentos das peregrinações e escaladas no alto daquele morro,juntando-se a fé inquebrantável daquele gente que se dirigiam à sua padroeira.O que levou o morro a denominar-se o morro dos milagres.Zefina,que fazia parte daqueles fiéis,sempre iniciava a sua escalada duas horas antes do Ângelo.Subia lentamente com as suas pernas já um tanto travadas,um pouco trôpega,ate se chegar naqueles mesmos horários todos dos dias a se penitenciar.
Zefina,não era flor de se cheirar.Em sua época de juventude e moça bonita e faceira,levava uma vida mundana.Fora uma prostituta de fino trato,a qual era sempre requisitadas pelos homens abastados fazendeiros da região.Recebia pela sua beleza inconteste,várias ofertas de matrimônio.Entre tantos havia Manoel,fazendeiro abastado de gado e terras que queria tê-la como sua consorte.
Corria a boca pequena,naquele antro de perdições,que dona Zefina,havia falido vários fazendeiros,em causa da sua beleza ímpar e das suas matreirices,as quais,lhes eram peculiares.Não se chegou a ser uma milionária,mas várias casas de alugueis e alguns pedaços de terras lhes eram atribuídas.
Naquela mesma igreja dos milagres,nos dias vinte e dois de março de um mil novecentos e noventa e dois,adentravam à aquela nave,trajando,ela,um vestido de seda chinesa em tons branco brilhante,com adornos em rendas de crochê,e sobre a cabeça um solidéu com pedrarias bordadas com pérolas legítimas,o qual escorria uma grinalda de três metros e meio a cair-lhes por aquelas costas macias e aveludadas.Era Zefina que havia se dobrado aos encantos do metal vil de Manoel,ou seja,o seu dinheiro.Ele,por sua vez,pelos encantos inapeláveis dela.
Manoel,no pico das suas emoções,jorrava o seu sorriso amarelado de lado a lado pelos corredores laterais e centrais da igreja onde se encontravam familiares e amigos.Apos as bençãos do vigário Chico,os convidados se deslocaram para a fazenda de Manoel onde foram distribuídos,com grandes farturas,seus comes e bebes regados a uma boa cachada e cervejas.
Agora,ali,nos últimos badalar dos sinos das dezoito horas,pelo rosto da pobre anciã,rolavam lágrimas de padecimentos e tristezas e amarguras,que lhe entranhavam pelas suas rugas endurecidas que os anos trataram de penitencia-la e cicatriza-la.Aquele rosto que outrora abrilhantavam em sua casa das pudicícias perdidas das jovens mariposas nas vidas mundanas,agora,batiam-lhes remorsos,sofrimentos naquele derradeiro restar de vida.
Nos primeiros anos de vida matrimoniais,foram os melhores de suas vidas,o que se tornou maior ainda,com a chegada do seu primeiro e único primogênito.Um misto de alegrias e tristezas havia lha invadido a alma naqueles dias.Seu filho viera ao mundo com um pequena deformação física.Depois de maior,as suas saídas à rua com o seu filho se tornaram raras em detrimentos do aspecto deformado do seu filho.Algumas pessoas chegaram o apelidar de Quasímodo,o corcunda de Notre Dame.
Loto apos três anos,a vida mais uma vez a punira.Fora de uma crueldade sem tamanho,levando o seu querido e amado esposo Manoel.Naquela época,se dizia ter morrido de nó nas tripas.Iniciou-se assim a debandada da sua juventude,e juntas,arrastando também,a sua estonteante beleza de mulher.Alguns meses mais tarde os desígnios batera mais uma vez à sua porta levando assim,o seu bem maior,o filho.
Zefina,alem das punições impostas-lhes pela vida,pesava ainda sobre se,os remorsos da sua causa meretrícia de um passado constrangedor,que para ela no hoje,seriam o fim.O sineiro Pedro,já se acostumara aos cotidianos de dona Zefa em suas peregrinações aquela igreja,mas não passava desapercebido a ele,o rápido degradar daquela pobre mulher que se arrastava todos os dias ate o altar-mor da capela.
Os sinos de Pedro rasgavam os céus daquele povoado sempre anunciando aos quatro ventos a hora do Ângelo.Naquele dia porem,algo diferenciado chamou à sua atenção naquela capela funesta e silenciosa.Faltava algo que ele logo notara,que era a não presença de dona Zefa no altar.Pensava ele com os seus botões,que deveria de estar adoentadas ou qualquer coisa que o valha.
Três dias se passaram sem a presença de Zefinha nos horários costumeiros.Zefina havia perecido,quando Pedro e alguns moradores do lugar resolveram invadir a sua casa,uma vez que se encontrava totalmente fechada.Encontraram-na jazida em um canto do seu fogão de lenha,inerte,e um tanto quanto mal cheirosa.
Apos o falecimento daquela mulher,as pessoas que já não frequentavam mais aquela capela,agora dificilmente iriam ate la.Data vênia,Pedro também partira em causa de um acidente de moto,a qual a própria,o levava todos os dias a subir ate o seu local de trabalho.A partir destas peripécias que a vida nos prepara,diziam,as pessoas do vilarejo,que o morro se tornara amaldiçoado.Todos do lugar tinham seus medos em ir aquele local.A partir dali não se ouvia mais um badalar de sinos,quando uma tarde de uma garôa branda,se ouviu um badalar de sino.Nos outros dias sequentes,vez ou outra se ouvia novamente ate que o sino ecoavam todos os dias nos mesmos horários,isto é,justamente as dezoito horas.Os moradores daquela corrutela começaram a se perguntarem quem estaria tocando o sino,uma vez que todos se conheciam.Chegaram a conclusão que,nenhum morador daquele local estaria a tocar o sino naquele morro aterrorizante.
Um grupo de moradores resolveram se deslocar ate aquela capela para constatar o mal assombrado.Chegaram todos ao mesmo tempo, dez minutos antes das dezoito horas quando em um repente o retumbar do sino invadiu aquela capela.A porta da igreja estava com uma das laterais aberta e a outra quebrada,mas dentro de uma densa penumbra se visualizava o interior da capela.Foram todos adentrando quando visualizaram um vulto sobre o altar-mor que logo constataram ser o de dona Zefina.Todos estavam atônitos ainda,quando se aproximou do altar-mor a figura de um jovem corcunda a acender os castiçais que ainda permaneciam intactos sobre o altar.
-E os sinos?! Alguém havia arguido,quando em um canto da igreja estava a figura reluzente,todo em branco:a figura de Pedro puxando a corda do sino todo sorridente.Em um repente,como um estourar de boiada,todos saíram em debandada morro abaixo.
Hoje,vez ou outra,não todos os dias,mas se houve ainda os sinos de Pedro na anunciação deles dentro daquela igreja.Dizem a boca pequena,que hoje,em várias capelas deste mundão de Deus,Pedro costuma dar o ar da sua graça em algumas delas.Se por ventura ouvires algum badalar de sino na sua capela,possa ser que seja Pedro querendo lhe agradar.