UM PRESENTE ESPECIAL

Havia tempo que a negociação acontecia:

— Tá caro!

— Mas é preço, senhor.

— Vê se me faz um desconto maior.

— Já lhe fiz o menor preço possível.

— Então me ache um modelito mais simples.

— Esse aqui é o mais rústico que tenho.

— Não tem nenhum com defeito de fábrica?

— Eu tenho um com a alça quebrada, mas pelo que o senhor falou, ele não caiará sob medida. Para quem é?

—É para minha sogra. É um presente especial que darei a ela. O primeiro e último.

-—...

__Devo reconhecer que apesar da difícil negociação essa compra está me dando um e enorme prazer.

__ Tenho uma mercadoria no estoque de preço bem razoável, pela medida que o senhor me passou vai servir perfeitamente para sua sogra.

— Não posso gastar muito além do que a velha vale. A bem da verdade, por mim, a enrolaria num lençol velho e jogaria no mar, mas sabe como é que é, ela é mãe da minha esposa, e avó dos meus filhos.

— De que morreu sua sogra?

— Creio que envenenada.

— Não foi o senhor que ...?

— Claro que não, por mais que não gostasse da velha, eu não seria capaz de estragar a minha vida por causa dela. Ela mesma se matou. Segundo o médico, ela engasgou com sua própria saliva. Para mim a velha se envenenou. A língua dela deve de ter contaminado a saliva.

__ Diante dos fatos, acho que esse com a alça quebrada serve, é só deixar a velha meio de lado e depois forçar um pouco para fechar o caixão.

— Fechado o negócio.

No velório, o genro chora copiosamente.

julio damasio
Enviado por julio damasio em 13/04/2007
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