Noite de lua cheia
Arrastou os passos até a porta de casa: excepcionalmente, estava cansado. Dera mais aulas do que o habitual e pesava-lhe o intenso exercício físico. “Não nos deixes”, “não aceitamos que nos deixes” – aquele coro de mulheres ainda zumbia no seu ouvido. Uma, duas, várias – todas a sua volta, insistindo para que ficasse. No momento em que colocava a chave na fechadura, sentiu uma presença do seu lado: “Tens que continuar.” Imperiosa, a voz prosseguiu: “Se não continuas, morres!” A lâmina penetrou-lhe o peito: desabou. Uma lua redonda, enorme, pairava sobre sua cabeça. Estatelado ficou, sem mensuração de tempo, vendo imagens que iam e vinham, a mente confusa, uma aflição que o fazia agitar-se, virar de um lado para o outro, intranquilo. Era alta madrugada quando acordou. Suando em bicas, apalpou-se: estava inteiro, estendido no sofá da sala. Através da cortina do pátio, esparramava-se o brilho da lua.