FEIÚRA POUCA É BOBAGEM
MÁRIO BELO, seu nome de registro.
De belo, porém, Mário, não tinha nada, a um primeiro olhar. Baixinho, atarracado, gordinho, como um pequeno tonel. Ostentava, de pronto, sua plena calvície, seu nariz torto e adunco, e seus óculos redondos de grossas lentes, como dois fundos de garrafa.
Conheci-o, numa roda de bar. Foi-me, apresentado, pelo Ricardo Alves, seu colega de trabalho.
- Muito prazer, Mário Belo, seu criado – puxou a cadeira e sentou-se ao meu lado.
Trajava um terno quadriculado. Uma camisa branca, de golas puídas, amarrotadas. Sapato preto e branco, mal-cuidado, bico fino.
Logo que se insinuou, à entrada, todos riram. Não entendi. Era o único do grupo que não o conhecia.
A conversa daquele dia não foi muito diferente da de sempre: mulheres, piadas, vida alheia.
Bebido o primeiro chopinho, Mário Belo, deixou dez reais debaixo de um copo no centro da mesa, e despediu-se de cada um, com um breve aperto de mão. Não disse por que veio e por que estava indo.
À sua saída, Ricardo Alves, com seu tom sarcástico de sempre e em voz baixa, sentenciou:
- Coitada da mulher do Mário Belo!
- Por que – inocentemente, argüi.
- Vai ser feio assim na China, Sô! – todos riram.
Apesar do cenário impróprio, e do nível alcoólico da maioria, tentei duas ou três contestações à apreciação maldosa proferida. Não logrei qualquer êxito. A cada comentário que objetava, mais o ridículo, o vil, o abjeto, no grupo, se impunha.
O tempo passou. Mais de um ano, quase dois. Nas poucas vezes que voltei a participar do grupo não encontrei mais o Mário Belo. Muitas vezes perguntei por ele. Ninguém sabia. E sempre que ele era lembrado, por mim, ou por um outro qualquer, o mesmo riso e o mesmo comentário:
- Etá cara feio, Sô!
Até que um dia, Ricardo Alves volta de uma semana na sua terra natal e vai logo avisando:
- Tive lá com o Mário Belo.
Todos riram.
- E pegou muita feiúra lá?
Contou então que o encontrou, no dia de sua volta, no centro da cidade, e, que o mesmo insistiu muito para ele ir até a casa dele conhecer a mulher dele e tomar um cafezinho.
Deu todas as desculpas possíveis. Em vão. A cada uma ele instava com maior insistência. Não teve escolha; foi.
- Conheceu a mulher dele? – perguntei.
- Conheci.
- E aí?
- Coitadinho do Mario Belo! Pobre coitado. Ele sim é a beleza em pessoa.